Conheça o baru, alimento do cerrado que vem fazendo a cabeça dos chefs

Depois do fruto: castanhas cruas, torradas ou cozidas em água são usadas em pratos doces e salgados (Crédito: Divulgação )
Por Ana Mosquera
RESUMO
• Baru compõe saladas, massas e sobremesas
• Uso da castanha nativa é importante para comunidades tradicionais
• O baruzeiro pede manejo sustentável e é um alerta para preservação do bioma brasileiro
Se o baru fosse americano ou europeu seria mais valorizado. Basta pensar nas conhecidas nuts, amadas pela maioria: avelãs, amêndoas, macadâmias. Assim como outras oleaginosas nativas – além da castanha de caju e a do Brasil (antiga variedade do Pará), há licuri, sapucaia, pequi, macaúba –, a semente do fruto do baruzeiro vem se esforçando para ganhar espaço na gastronomia. Ou melhor: os chefs estão lutando, aliados a comunidades extrativistas do produto do Cerrado.
O baru está na base da cultura alimentar de grupos espalhados pelo País, garantindo a renda de famílias e promovendo o desenvolvimento econômico local — além da preservação da fauna e da flora a partir de práticas sustentáveis e do manejo adequado dos biomas.
Bem mais amenos que os desafios logísticos na distribuição e beneficiamento da castanha-de-baru, os chefs também enfrentam dificuldades gastronômicas ao incluir o ingrediente em seus cardápios. “Para a elaboração do chocolate, a semente precisa passar por um processo de torrefação para que seu sabor se destaque e seus nutrientes sejam mais aproveitados”, diz Beatriz Branco, fundadora da marca Angí e porta-voz do Slow Food Pantanal.
Para conseguir a matéria-prima aos seus chocolates ela trabalha em parceria com ONGs, cooperativas, comunidades quilombolas, assentamentos rurais e a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.

A quantidade de nutrientes na pequena castanha de casca amarronzada está longe de ser desprezável. Assim como outras nozes, é composta de quase 30% de proteína, rica em vitamina C, ferro e antioxidantes e considerada um alimento funcional. “A amêndoa é uma alternativa para diversificar os pratos do público vegano. Além de servir para pastas e pães, é possível fazer leite vegetal e, com seus resíduos, tortas, salgados e biscoitos amanteigados”, diz Eliane Regis, chef de cozinha e militante do Slow Food, movimento com origem na Itália, que preza pelo “alimento bom, limpo e justo”.
A cozinheira lembra sobre o aproveitamento total do fruto de onde sai a castanha. “O mesocarpo resulta em uma farinha espessante e a própria semente, em óleo ou como material para artesanato e biojoias.”
Até a madeira da árvore de baru é valiosa, o que causa preocupação, por conta de sua retirada excessiva para a construção civil e a plantação de commodities — os alertas de desmatamento do Cerrado cresceram 24% em março de 2024, comparado ao do último ano, segundo o Inpe.


“O baruzeiro é uma árvore marcante da nossa região. Digo marcante porque ela pode chegar a 25 metros de altura”, diz a chef Ariani Malouf. No Mahalo Cozinha Criativa, em Cuiabá, ela mantém pratos como o pintado em crosta de ervas, em que o baru ganha forma de purê, que é servido em uma cerâmica decorada à mão pela artista mato-grossense Ruth Albernaz. Mais um ponto para a valorização da região do bioma ameaçado de extinção.

“A conscientização sobre os benefícios do baru entre chefs e consumidores pode aumentar a demanda e os investimentos necessários em logística.”
Beatriz Branco, fundadora da Angí e porta-voz do Slow Food Pantanal
Brasilidade no prato
Há mais chefs que levantam a bandeira do baru e outros ingredientes nativos, como Ana Paula Boquadi, do Chichá Café e Bistrô, em Brasília, e Hugo Souza, do Cantô Gastrô & Lounge, no Grand Hyatt Rio de Janeiro. “O maior desafio de usar o baru é a eventual restrição alimentar dos clientes, por ele ser uma oleaginosa. Mas é muito versátil ao paladar e, quando tostado, tem pronunciado seu dulçor semelhante à avelã.”, diz Souza.
Ainda no Sudeste, a chef Bela Gil é outra entusiasta do alimento. Em seu restaurante em São Paulo, o Camélia Òdòdó, ela serve cookies com a castanha brasileira e uma salada intitulada Refazenda, em homenagem à canção de seu pai, Gilberto Gil.
