Os sonhadores parisienses

Laira Vieira: "Atualmente, em um mundo cada vez mais conectado virtualmente — mas paradoxalmente distante emocionalmente — a busca por autenticidade e conexão genuína torna-se uma jornada cada vez mais desafiadora, quase impossível" (Crédito: Divulgação)
Por Laira Vieira
No turbilhão da Paris de 1968, onde as ruas fervilham com os protestos estudantis e os ventos da mudança sopram, surge um filme que desafia as convenções, quebra tabus e mergulha nas profundezas da mente humana, gerando polêmica entre os puritanos.
Os Sonhadores (2003) — disponível no Mubi — dirigido por Bernardo Bertolucci (O Último Imperador, Eu e Você) não é apenas uma obra cinematográfica, mas sim uma jornada intrépida pelos labirintos da juventude, sexualidade e revolução, é um filme sobre as aventuras da juventude, sem os típicos clichês do gênero.
Na trama, somos apresentados a Matthew (Michael Pitt), um jovem americano, que vai estudar em Paris, e se vê imerso no universo efervescente de Isabelle (Eva Green) e Theo (Louis Garrel), gêmeos franceses que compartilham sua paixão pelo cinema e sua inquietação diante do mundo. O trio de cinéfilos estabelece uma relação intensa, onde os limites entre amizade, amor e desejo se tornam cada vez mais difusos.
A sensualidade é explorada de maneira crua e provocativa, desafiando as convenções morais e expondo a natureza humana em sua forma mais intensa. A nudez é tratada como um elemento de libertação, uma manifestação da busca pela autenticidade em meio ao caos da vida.
A atmosfera libertária serve como pano de fundo para as experiências transgressoras dos protagonistas. Entre debates filosóficos, sessões de cinema — com muitos trechos de filmes clássicos pipocando na tela — e jogos de poder, a película nos conduz por uma montanha-russa emocional, onde a busca pela identidade e a quebra de tabus se entrelaçam de forma visceral.
A dinâmica entre o trio reflete não apenas as transformações sociais e culturais daquele período, mas também aspectos da natureza humana que continuam a ressoar conosco até hoje.
É nesse contexto que a frase de Jean-Paul Sartre ecoa com intensidade: “O inferno são os outros”. A complexidade dos relacionamentos interpessoais revela a fragilidade da condição humana e a dificuldade de se alcançar uma verdadeira conexão emocional.
Mas por trás da aparente liberdade, esconde-se uma sensação de vazio e desencanto. Imersos em suas próprias fantasias e ideais, eles lutam para encontrar um sentido para suas vidas em meio à efemeridade da juventude.
Atualmente, em um mundo cada vez mais conectado virtualmente — mas paradoxalmente distante emocionalmente — a busca por autenticidade e conexão genuína torna-se uma jornada cada vez mais desafiadora, quase impossível.
Os Sonhadores é um lembrete poderoso de que, por mais que possamos nos sentir revolucionários ou rebeldes em nossas aspirações, estamos todos conectados por nossa humanidade, pela complexidade e fragilidade que a acompanham.