Quem salva a democracia?

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Marcos Strecker: "O movimento eficaz da Justiça para punir as tentativas golpistas de Jair Bolsonaro tem provado que as instituições democráticas são mais sólidas do que se supunha" (Crédito: Divulgação)

Por Marcos Strecker

Há pouco tempo, havia um sentimento generalizado de que Donald Trump iria conseguir uma vitória fácil sobre Joe Biden em novembro. O empresário lidera as pesquisas, atropelou os rivais republicanos e vai conseguindo driblar as dezenas de processos contra ele. Por outro lado, o atual presidente democrata, além de cronicamente impopular, continua sendo um motivo de piada por sua idade avançada e pelas gafes em discursos.

Mas o momento eleitoral está mudando. Aos poucos, Biden repete seu movimento de quatro anos atrás, angariando apoio na sociedade e em seu partido, firmando-se como o fiador da democracia. Usa a seu favor o peso político da Casa Branca, fator nada desprezível. Isso atormenta o magnata, que usou e abusou ilegalmente da sua cadeira no Salão Oval para tentar melar o pleito em 2020.

Nos EUA como no Brasil, a força das instituições e da sociedade explica por que populistas estão cada vez mais em apuros

Um eventual êxito de Biden será um alívio para a Europa, que enfrenta a ameaça militar russa e os movimentos de extrema-direita. Apoiados pelos amigos de Trump no continente, os radicais devem crescer decisivamente nas eleições do Parlamento Europeu, em junho. Se o democrata ganhar nos EUA, ao contrário, o rastilho de pólvora dos movimentos antidemocráticos que explodiram desde 2016 pode começar a se extinguir. Há um certo cansaço com essas tentativas de minar a democracia.

E no Brasil? O movimento eficaz da Justiça para punir as tentativas golpistas de Jair Bolsonaro tem provado que as instituições democráticas são mais sólidas do que se supunha. O putsch do capitão não se viabilizou porque ele se defrontou com Poderes enraizados e não conseguiu apoio suficiente na sociedade. Isso explica mais o fiasco do capitão do que a nova convicção democrata da cúpula fardada ou o triunfo popular de Lula nas urnas, ainda que esses fatores obviamente também tenham sido importantes (esse argumento contraria o sebastianismo petista, naturalmente).

Dois cientistas políticos que defenderam em linhas gerais essa tese, Marcus André Melo e Carlos Pereira, estão lançando Por que a democracia brasileira não morreu?. Os dois remaram contra a corrente dos acadêmicos que viram no risco populista uma catástrofe iminente. Com rigor acadêmico, apontam as virtudes do presidencialismo multipartidário. A obra de certa forma vai na contramão da moda editorial (global) dos livros sobre o fim da democracia, que perde força — e pode virar obsoleta se Trump de fato for derrotado.