Brasileiros invadem universidades argentinas: confira benefícios e perrengues
Ausência de vestibular, vagas ilimitadas, qualidade da educação e baixo custo de vida — pelo menos até o início deste ano — são fatores que têm atraído jovens às universidades do país vizinho

Fernanda Martins (à dir., no laboratório da universidade) ao lado de seus colegas brasileiros, do curso de medicina (à esq.), realizam atividades no Dia Mundial do Coração: amizades que vão além da sala de aula (Crédito: Divulgação )
Por Mirela Luiz
O aumento no número de estudantes brasileiros na Argentina é um fenômeno que ganhou destaque nos últimos anos. Só os alunos que cursam Medicina, por exemplo, quintuplicaram: passaram de quatro mil para mais de 20 mil, em sete anos, de 2015 para 2022, último dado do governo local. Na Universidad de Buenos Aires (UBA), a de maior relevância no país, 9,5% dos alunos de graduação são estrangeiros. Na pós-graduação, que exige cobrança de taxas, esse número é de 16,5% de acordo com o jornal La Nación.
A Argentina é considerada um país bastante aberto a imigrantes. Segundo a Constituição, gozam quase dos mesmos direitos que os habitantes locais. Um em cada quatro alunos de medicina é estrangeiro (24%), incluindo peruanos e paraguaios. “São sete anos longe da sua família, mas vale a pena cada ano concluído”, declara a estudante paulista Fernanda Martins, aluna do terceiro ano do curso de Medicina da Fundación Barceló, em La Rioja.
Entre os motivos que levam os brasileiros a escolher estudar Medicina na Argentina estão:
• a ausência de vestibular,
• o número ilimitado de vagas,
• a qualidade da educação,
• e os custos mais acessíveis, em comparação com o Brasil.
“Hoje, 60% da minha sala é de brasileiros. Acredito que, se mais estudantes tivessem acesso a informações sobre o curso, haveria ainda mais brasileiros aqui”, declara Fernanda.
Segundo o último levantamento feito pelo Itamaraty, cerca de 65 mil brasileiros estudam Medicina no Paraguai, Bolívia ou Argentina. Esse número cresceu muito nos últimos anos e já representa um terço dos estudantes desse curso nas universidades do Brasil.

No entanto, recentemente, o aumento dos preços e a desvalorização do dólar ‘blue’ tem feito com que alguns repensem essa decisão. Alguns até desistem do curso.
“A inflação é um problema real. Hoje as frutas estão um preço, amanhã custam o triplo. Isso acaba deixando a vida mais cara, mesmo para quem recebe em real”, diz Fabiana Fogaça Monteiro, estudante do último ano de Medicina na Universidad Nacional do Rosario (UNR).
Apesar dos desafios, como a barreira do idioma e relatos de preconceito, muitos brasileiros têm se adaptado à vida acadêmica argentina e encontrado formas de se integrar à comunidade local. “No começo foi muito difícil, porque não falava o idioma, não conseguia entender. Hoje já estou bem integrada. Tenho amigos e um namorado argentino, me sinto um pouco mais em casa”, afirma Fabiana.
Acolhimento
Associações atléticas, cervejadas e outras atividades típicas do universo nacional têm se proliferado nos arredores dos campus argentinos, criando uma atmosfera familiar para os estrangeiros.
“Fiz amigos no primeiro ano do curso e nos tornamos uma família. Comemoramos a Páscoa, mas também festa junina e outras datas típicas”, revela a formanda.
No entanto, nem tudo são flores.
• A exigência de fluência no espanhol,
• as dificuldades nas provas orais,
• e a incerteza em relação ao futuro profissional fazem com que muitos se deparem com dilemas ao longo do curso.
“Já havia feito Biomedicina e pós-graduação em Hematologia e Hemoterapia, na Unifesp. Como já tinha mais idade, não quis fazer cursinho para entrar na faculdade no Brasil. A mensalidade custava na época cerca de R$ 800, enquanto no Brasil era cerca de R$10 mil. Por isso fui cursar fora”, conta Thais Miranda Bresciani, formada em 2018 pela Fundacion H. A. Barceló, em Buenos Aires.
Hoje ela é médica e mora em Santos. Atua pelo programa Mais Médicos, do Governo Federal, porque ainda não conseguiu fazer o Revalida. A decisão de permanecer na Argentina e exercer a profissão ou voltar ao Brasil e prestar o Revalida é um dos desafios que os alunos enfrentam ao final da graduação. “Não pretendo voltar para o Brasil, mas para o Chile, um dos países que reconhecem nosso diploma”, explica Fabiana.
