Comportamento

Conheça os bilionários que querem pagar mais impostos para evitar colapso social

Super-ricos que assinaram carta por sobretaxas, levada a Davos, sabem que a desigualdade de riqueza ameaça a economia global e a democracia

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João Paulo Pacifico, o único brasileiro a assinar a carta de Davos, inseriu cooperativas do MST no mercado financeiro (Crédito: Divulgação)

Por Denise Mirás

Foi em uma quarta-feira histórica, 17 de janeiro deste ano, em que mais de 250 bilionários apresentaram abaixo-assinado ao Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, pedindo para que governos aumentem a taxação sobre suas fortunas. Ainda que por vezes os megarricos que se dispõem a viver com menos sejam chamados de hipócritas por muitos críticos, causou impacto a declaração que tem por objetivo “transformar a riqueza extrema e improdutiva em investimento para o nosso futuro democrático comum”.

Marlene Engelhorn, herdeira austríaca da BASF — a gigante alemã da indústria química —, é uma das signatárias da carta “Proud to Pay More” (algo como “Orgulho em Pagar Mais”), que reúne dezenas de nomes de 17 países, como:
• Abigail Disney, documentarista;
• Simon Pegg, roteirista;
• Valerie Rockefeller, ambientalista,
• e o brasileiro João Paulo Pacifico, fundador do grupo de investimentos Gaia.

São eles que dizem: “Pedimos que nos tributem. Isso não irá alterar o nosso padrão de vida, nem prejudicará nossos filhos ou o crescimento econômico de nossas nações”.

O documento foi divulgado pouco depois da Oxfam destacar que os cinco homens mais ricos do mundo duplicaram suas riquezas a partir de 2020 (justamente no período da pandemia), enquanto 60% da humanidade ficava mais pobre. E ainda que o planeta deverá ter um primeiro trilionário nesta próxima década.

A inglesa Oxfam (de Oxford), que desde 1942 reúne organizações de 90 países atuando em projetos sociais de urgência e desenvolvimento, alerta: permanecendo a tendência de desigualdade no planeta, a pobreza não será erradicada nos próximos 229 anos.

Valerie Rockfeller é a herdeira da dinastia que enriqueceu com petróleo (Crédito:Divulgação)
Simon Pegg: o comediante lembra que bilionário paga menos que empregado (Crédito:Lisa Maree Williams )
Abigail Disney: para ela, o que herdou é “uma quantidade absurda de dinheiro” (Crédito:JP Yim /)

Um dos signatários do “Proud to Pay More”, o ator escocês Brian Cox destacou que “bilionários estão usando seu dinheiro para acumular poder e influência política, minando a democracia e a economia global”. Aos 77 anos, diz que passou da hora de os representantes eleitos pelo povo agirem, com relação à concentração de dinheiro e poder, prevendo “consequências terríveis” para o planeta.

Juntamente com a carta, uma pesquisa da Survation (agência que faz parte do British Polling Council) foi apresentada em Davos pelo grupo americano Patriotic Millionaires. Dos dados coletados entre 2.300 entrevistados de países do G20 (com pelo menos US$ 1 milhão em ativos para investir, sem contar suas casas), verificou-se que 66% apoiam impostos mais altos para eles mesmos, desde que aplicados no enfrentamento da crise populacional, agravada com a alta do custo de vida, e na melhoria dos serviços públicos.

Mais da metade (54%) pensa que a concentração de riqueza é uma ameaça às democracias, como Abigail, a herdeira do império Disney, para quem “a conseqüência inevitável é o descontentamento extremo das massas, que estão recorrendo ao populismo — em ascensão no mundo todo”.

Quem é o brasileiro?

João Paulo Pacifico, único brasileiro a assinar a carta apresentada ao Fórum Econômico Mundial, é o fundador da Gaia, lançada em 2009 como empresa de investimentos e doada a uma ONG em 2022 — desde então, valores foram revertidos a projetos de impacto social, como moradias populares, por exemplo.

Pacífico apresentou programas de rádio e escreve artigos sobre bem-estar corporativo (é autor dos livros Onda Azul e Seja Líder como o Mundo Precisa). Além de conselheiro do Greenpeace, colabora com as cooperativas do MST (Movimento dos Sem-Terra), que levou ao mercado financeiro.

Aos 45 anos, afirma que não é possível seguir acumulando dinheiro e querer reduzir a desigualdade social, que leva a “graves riscos à estabilidade econômica, social e ecológica mundial”, como alerta o documento dos super-ricos entregue em Davos.

Marlene Engelhorn, 31 anos, e outra signatária da sobretaxação dos bilionários, em 2021 já havia conseguido 60 assinaturas de “super-ricos de língua alemã”, pedindo que o governo do país cobrasse mais tributos deles. Foi o início do #taxmenow (ou taxe-me agora), um movimento em favor da distribuição da riqueza e que agora reúne alguns dos maiores herdeiros do planeta.

Mas a austríaca também é a favor das doações em vida. Diz que abrirá mão de 90% de seus bilhões porque “não preciso e nem parece justo ter tanto dinheiro”.

Uns doam e outros vão na contra-mão

Em 1991, a Forbes afirmou que a fortuna das cinco pessoas mais ricas do mundo somava US$ 70 bilhões. Três décadas depois, esse valor foi multiplicado por dez.

Bill Gates, o fundador da Microsoft, em 2022 anunciou a doação de US$ 20 bilhões à Fundação Gates, que atua em projetos sociais de 130 países. Hoje a sexta pessoa mais rica do mundo, com US$ 119,8 bilhões, Bill Gates declarou que seguiria doando “até sair da lista da Forbes”.

Ao menos US$ 55 bilhões já foram doados por ele e a ex-mulher Melinda, que ultrapassaram o amigo Warren Buffett — sétimo dos mais ricos com US$ 118,6 bilhões (fora os US$ 48 bilhões doados, a maior parte para a mesma instituição).

Críticos destacam a hipocrisia dos doadores da lista Forbes 400: mesmo com US$ 250 bilhões arrecadados em 2023, dois terços dos bilionários não tiraram do bolso mais de 5% do que possuem.

Enquanto isso, Jeff Bezos, o czar da Amazon e terceiro na lista da Forbes com US$ 168,4 bilhões, é conhecido pelas péssimas condições empregatícias e atitudes antitrabalhistas.

Elon Musk (no topo do ranking, com US$ 251,3 bilhões), que era visto como excêntrico, agora é execrado pela proximidade a neonazistas.

Bill Gates e Warren Buffett encabeçam lista de filantropos (Crédito:Divulgação;Kevin Dietsch)
(Fotos: Divulgação;Kevin Dietsch)