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Eleições municipais: polarização em São Paulo é só o começo

A disputa eleitoral na capital paulista deverá sintetizar o embate que poderá ocorrer entre Lula e Bolsonaro nas eleições municipais deste ano, reproduzindo o pleito de dois anos atrás, marcado por um clima de beligerância política

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Lula agiu rápido e convenceu Marta Suplicy a aderir à campanha de Boulos (Crédito: Fotoarena)

Por Marcelo Moreira

Em conversa franca, o prefeito da maior cidade do País sentiu todo o peso da polarização política que domina o Brasil nos últimos anos, sobretudo a partir da eleição presidencial de 2018, e que deve repetir o clima de belicismo na eleição municipal deste ano em São Paulo. “Não posso estar no mesmo palanque que Jair Bolsonaro”, disse Marta Suplicy, de forma direta, ao prefeito Ricardo Nunes (MDB), ao anunciar o seu pedido de demissão do cargo de secretária de Relações Internacionais da Prefeitura de São Paulo.

Marta, nome de destaque da política nacional, e ex-prefeita paulistana entre 2000 e 2004, deixava o cargo para ser candidata a vice-prefeita na chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL), o principal adversário à reeleição de Nunes, com direito à refiliação ao PT, mesmo que contrariando petistas. O ousado movimento teve participação direta do presidente Lula, que está disposto a impor mais uma derrota aos partidários do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em São Paulo, onde o PT já elegeu três prefeitos.

Há algum tempo os ensinamentos de dois livros são largamente aplicados em eleições de todos os tipos, não só no Brasil. A Arte da Guerra, de Sun Tzu, prega que surpreender inimigo é fundamental para vencer batalhas. O Jogo Bruto das Copas do Mundo, de Teixeira Heizer, sobre futebol, costuma apregoar que muitas vezes as partidas são vencidas na véspera, por detalhes, e nos bastidores. Ricardo Nunes vivenciou essa experiência ao assistir, meio que impotente, o assédio lulista a Marta, em um ardil considerado preliminar do embate que se dará entre o atual presidente e o ex-mandatário.

Ricardo Nunes pretende se apoiar nas realizações de seu governo e evitar brigas

A eleição municipal de São Paulo sempre será um campo de batalha principal em qualquer eleição, mas em 2024 a disputa na maior cidade do país dará a tônica de como a polarização será predominante em todo o pleito nacional, em quase todas as cidades, como previu o presidente Lula na Conferência Eleitoral do PT 2024, realizada em Brasília em dezembro último: o combate ao bolsonarismo não terminou na eleição de 2022 e ficará ainda mais acirrado. Afinal, quem sair vitorioso em 2024, se fortalece para 2026.

À espera de Bolsonaro, Ricardo Nunes (esq.) recebe Tarcísio de Freitas de braços abertos (Crédito:Marina Uezima)

Eleição antecipada

As mudanças de estratégia em tempos de polarização e nenhuma conciliação envolvem decisões que quebram tabus. Pela primeira vez, desde que foi fundado, em 1980, o PT não terá candidato a prefeito em São Paulo. Foi o caminho encontrado para derrotar políticos conservadores, que venceram o próprio PT em 2016.

Fernando Haddad, ex-prefeito petista, perdeu a reeleição para João Doria (PSDB). Em 2020, o hoje deputado federal Jilmar Tatto ficou em sexto lugar no primeiro turno, com apenas 8,6% dos votos. Diante da falta de alternativa viável, Lula preferiu apoiar Guiherme Boulos (PSOL) no pleito, mesmo contrariando dirigentes petistas de São Paulo. Por enquanto, o líder sem-teto aparece em primeiro em algumas pesquisas.

Neste vale-tudo para infligir uma derrota ao campo conservador na capital paulista, a campanha de Boulos, turbinada pela boa avaliação de Marta Suplicy na periferia, vai tentar usar a máquina do governo Lula e reforçar a polarização política nas campanhas no rádio e televisão, afirmando que Ricardo Nunes representa o “bolsonarismo”.

Oficialmente, Ricardo Nunes afirma desejar o apoio de Bolsonaro e desconversa sobre a saída de Marta do secretariado.

Entretanto, a campanha do prefeito já tem dois eixos propostos para conter o avanço de Boulos e que estão lastreados na mais pura polarização:
• explicitar o perfil de “esquerdista” do candidato do PSOL,
• reforçar a sua ligação com o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), responsável por invasões de imóveis na Capital.

Um aliado de primeira hora de Nunes é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), um dos principais bolsonaristas, que já se dispôs a entrar de cabeça na campanha à reeleição do prefeito.

Tarcísio afirmou que Bolsonaro deve apoiar Nunes em São Paulo. “Ele sempre teve uma boa relação com o Ricardo Nunes. É um apoio importante e traz uma parcela da direita para essa candidatura.”

O deputado Baleia Rossi (MDB-SP), coordenador-geral da campanha de Nunes, reforça o bordão que criou para amenizar o ambiente de polarização. “O prefeito é um radical de centro. Enquanto Boulos fica querendo briga, Ricardo vai buscar o consenso e o diálogo.”

Essa polarização deverá ser reproduzida também em outras capitais.

• No Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes (PSD) deverá ter o apoio do PT e de outras forças de esquerda, contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), lançado por Bolsonaro para ser o candidato a prefeito da Cidade Maravilhosa.

• Em Recife, o prefeito João Campos (PSB), deverá ter o PT como vice na campanha da reeleição para enfrentar o candidato bolsonarista Gilson Machado (PL), ex-ministro do Turismo do governo Bolsonaro.

As eleições municipais prometem altas temperaturas.