Comportamento

Picles de frutas: a tendência que vai abrir seu paladar

Novos picles ganham menus em preparos clássicos, contemporâneos e até drinques. Criada para preservar ingredientes, técnica milenar extrai sabor além do doce

Crédito: Rogerio Cassimiro

Ananda Lutzenberger, chef, e Benjamin Seroussi, sócio da Shoshana Delishop: 10kg de conserva de manga e tomate por semana (Crédito: Rogerio Cassimiro)

Por Ana Mosquera

Se a tendência do último verão no Hemisfério Norte foram os picles de frutas, segundo o site especializado Taste, é a vez de a temporada brasileira abrir as portas para as conservas além da geleia. Sobre saladas, peixe cru ou ostras, dentro de coquetéis e sanduíches ou em tábuas, combinados com os de outros vegetais, os picles de maçã, uva, limão e manga abrem um caminho de possibilidades: para preservar as frutas e surpreender o paladar.

Trocar o dulçor pela extração da acidez desses alimentos confirma a busca por sabores contrastantes. Apesar de poder levar açúcar, a base da mistura está no sal, no vinagre ou em ambos, sendo uma forma de conservar os alimentos pré-geladeira ­— era consumido pelos mesopotâmicos e Cleópatra foi uma grande apreciadora.

(Rogerio Cassimiro)

“Os picles não precisam mais atravessar as estações e melhorar o sabor do pão e da batata, mas é muito bonito observar como algo ancestral se mantém. Fazer picles é uma forma de atravessar o tempo”, diz Benjamin Seroussi, sócio da Shoshana Delishop, em São Paulo, especializado em culinária judaica.

Entre as opções estão manga verde com capim santo e pimenta rosa, e tomate verde com a erva endro e grão de mostarda. Os dois levam duas semanas para adquirir textura e sabor desejados.

“Trabalhar com insumos de 15 dias e não de 15 minutos é encantador. É um universo que, assim como a panificação, encanta a nova geração que vai contra o imediatismo da cozinha”, diz a chef Ananda Lutzenberger. As conservas obedecem, mais do que tudo, ao tempo.

Sem desperdício

No Japão, as conservas de frutas, legumes e verduras são chamadas de tsukemono e estão muito presentes no dia a dia daquela cultura. Elas fazem parte do bentô, a marmita japonesa, e em tríade com o gohan (arroz típico) e o missoshiro (sopa à base de soja) representam a base da alimentação: uma “comida de conforto”.

No Aizomê, em São Paulo, a chef Telma Shiraishi utiliza os frutos de acordo com a disponibilidade, reforçando a filosofia japonesa do não-desperdício, o “mottainai”. Há maçã verde com salsão na borra de saquê, melancia no vinagre de arroz com sal e açúcar, umê (fruta japonesa) no sal e mamão verde no missô (pasta de soja fermentada) de banana.

A última foi criada no Brasil, já que a prática atravessou o planeta com os imigrantes. “Pelo Japão ser um país com muitos desafios geográficos e clima rigoroso, foi-se desenvolvendo uma culinária em que se aproveita ao máximo o que a natureza provê e que se consegue cultivar”, diz. O tsukemono de fruta está mais restrito ao ambiente caseiro, mas a chef garante: com saquê ou cerveja vão muito bem.

Chef Telma Shiraishi, do Aizomê, e seu prato Ume Ochazuke: arroz, umeboshi e chá verde.Suas conservas de maçã e salsão, melancia e mamão (Crédito:Rogerio Cassimiro)
Rogerio Cassimiro

O chef Fred Caffarena vivenciou a paixão turca pela técnica quando esteve em Istambul. “Eles têm um amor tão grande por picles que até tomam seu líquido. O ‘turşu suyu’, que literalmente significa ‘suco de picles’, é bebido gelado, com ou sem açúcar, e às vezes diluído em água com gás”, diz.

No restaurante Make Hommus, em São Paulo, ele varia os tipos, mas o de limão siciliano com sal nunca falta — serve de base para temperos, uma pasta com azeitona e marinadas.

Outros profissionais abusam dos picles em criações. No Bar dos Cravos, a bartender Steph Marinkovic aposta no de uva em coquetel com o destilado shochu, saquê e capim santo.

No Bosco Restaurante, a chef Natalia Ebone usa picles de maçã em entrada com atum cru.

Os picles não são um novo, mas outro jeito de conservar as frutas.