Comportamento

A popularização do chá: vários públicos, diferentes experiências

Preparação da planta asiática ganha destaque em casas típicas, cursos e exposições. Além da saúde, variação de tipo e preparo atrai novos públicos e gerações, comprovando seu protagonismo como bebida social

Crédito: Caio Guatelli

Bruno Konig Manfrin, atendente da Motchimu, em São Paulo: precisão na pesagem do produto e na qualidade da água (Crédito: Caio Guatelli)

Por Ana Mosquera

“Não tem hora certa para consumir os chás”, diz o empresário Jun Murakami. No Japão, a bebida feita com a Camellia sinensis está presente no cotidiano das pessoas tanto quanto o café está no Brasil. Tem até versão do chá sem cafeína, para tomar no final do dia. Apesar de as primeiras mudas da planta datarem da chegada de Dom João VI ao Brasil, foi a partir da década de 1920 que o cultivo se intensificou no Vale do Ribeira, em São Paulo.

Depois de entrar no convívio de parte da população como o “chazinho” que finalizava o rodízio japonês dos anos 2000, cada vez mais o chá verde deixa bairros e restaurantes típicos para atingir novos públicos. Na capital paulista, casas como Chá Yê, Motchimu e Mori Chazeria trazem desde degustações de bebidas quentes e geladas até preparações diferentes como:
• waffles,
• carolinas,
• sorvetes,
• e outras sobremesas.

Na Moncloa, há diversos tipos de matcha (chá verde em pó), quentes ou gelados, em sabores como manga, abacaxi e pêssego. “Além da presença online de boas lojas de chá, muitos dos melhores shoppings centers Brasil afora têm pontos de vendas de chás especiais de diferentes marcas”, fala Marília Vargas, sommelière de chá.

Apesar das inovações e para garantir os utensílios típicos, ceramistas moldam peças para rituais oferecidos em museus e eventos por profissionais especializados.

Para Luciana Reginato, presidente da Associação Brasileira do Chá, a ABChá, o movimento veio para ficar e não está mais ligado ao tratamento de enfermidades. “As pessoas estão descobrindo uma opção de bebida social, para ser consumida sozinha ou harmonizada com alimentos, acompanhando refeições, em momentos de autocuidado ou compartilhado com amigos.”

A economista ambiental Alessandra Simiema pensa nos benefícios para o corpo e a mente. “Antigamente, íamos muito atrás das experiências de bebidas ligadas ao álcool, mas agora estamos atrelando-as com a saúde.”

O aumento dos cursos de sommelier de chá e de casas com degustações comprova o quanto as pessoas se interessam pela vivência. “São experiências que nos dão acesso a outras culturas”, diz Pâmela Padua, engenheira agrônoma.

Pâmela Padua, engenheira agrônoma, e Alessandra Simiema, economista ambiental: estreia na tendência de casas típicas (Crédito:Caio Guatelli)

Versão especial

As cores contribuem para as tendências gastronômicas por atraírem diferentes gerações. “Hoje o principal público da Motchimu são os Millennials, mas vejo que uma porção da geração Z está à procura de um lifestyle mais equilibrado, colocando o matcha na rotina”, diz Murakami.

No estabelecimento em São Paulo, o especialista em cerimônia do chá Bruno Konig Manfrin apresenta as outras quatro variedades (uma delas combina as folhas jovens da planta com arroz torrado), além de versões geladas da bebida.

A tradição convive com o novo também no Japão e ao mesmo tempo em que se mantêm os rituais de consumo, a tecnologia dá a cara em novos produtos, em casa ou nas ruas.

Na exposição Nihoncha, introdução ao chá japonês, que acontece até abril na Japan House São Paulo, um tipo de cafeteira que avisa familiares de idosos, caso a bebida fique armazenada por mais tempo do que o recomendado, divide espaço com o protótipo de uma típica casa de chá japonesa (ainda que impressa em 3D).

“No Japão, os chás mais industrializados estão presentes em praticamente todas as máquinas”, fala Murakami. No Brasil, a inovação fica por conta dos preparos com a planta.

Enquanto os mais convencionais mesclam as variações da folha com água de boa qualidade, em casas mais comerciais as bebidas ganham componentes lácteos e até mesmo chocolate. “É cada vez mais comum encontrarmos oferta de matcha nas cafeterias, e o chá verde e o preto também vêm aparecendo com maior frequência e obtendo mais sucesso, à medida que os métodos de preparo são aperfeiçoados, melhorando a qualidade da bebida final”, diz a sommelière Marília Vargas. O chá preto, muito consumido na Inglaterra, também é derivado da Camellia sinensis, assim como o branco e o oolong.

Além do matcha, sem cafeína ou com arroz torrado, diferentes processos garantem outras cores e sabores (Crédito:Divulgação)

A especialista em chás Paula Su vê a ascensão da cultura pop coreana como responsável pela difusão da Camellia, não só em blends e infusões.

Ela compara a evolução quanto aos tipos e modos de consumo à da bebida mais brasileira. “É como conhecer a especialidade de um grão de café hoje em dia. Muitas pessoas já dominam o assunto, mas outras ainda não.” Será questão de tempo falar em chá especial?