Inteligência artificial vai explodir no ano que inicia; saiba como
Após a consolidação da Inteligência Artificial aplicada a linguagem, como é o caso do ChatGPT, o próximo passo será o audiovisual. A falta de regulamentação do setor também preocupa especialistas
Perspectivas 2024: Tecnologia
Por Ana Mosquera
“A inteligência artificial está aqui, mas não devemos interpretá-la como mágica ou deixaremos de fazer perguntas críticas”, diz Anderson Rocha, professor titular de IA no Instituto de Computação da Unicamp e coordenador do Laboratório de IA da instituição estadual. No último ano, o boom dessa tecnologia — do lançamento do chatbot do Google, o Bard, às discussões sobre proteção de dados — acompanhou o receio de que ela substituirá o ser humano.
Obras de arte feitas por máquinas foram premiadas, músicas inéditas de grupos que não existem mais foram lançadas e houve até lei redigida pelo ChatGPT, da OpenAI, em Porto Alegre.
Se em 2023 se tornaram comuns as listas de profissões que teriam o fim decretado, a chegada de 2024 mostra que é necessário ignorar a gritaria e aprender a trabalhar com a IA como aliada. “Começamos a amadurecer a linha de raciocínio do uso da IA como um copiloto. Mudamos a estratégia de ação e passamos a discuti-la como uma forma de inteligência aumentada”, diz Rocha. “Se uma ferramenta pode ajudar a descobrir uma vacina ou um medicamento novo, temos de entendê-la melhor, para que um especialista humano consiga acompanhar o processo.”
Empatia e bom humor
A previsão é de avanços contínuos na área conhecida como “aprendizado profundo”. “Seja para novos modelos de linguagem, como versões atualizadas de modelos conversacionais, como o ChatGPT, seja para o lançamento de modelos visuais de grande escala.”
Ele se refere ao LVM (Large Visual Model) um modelo diferente do LLM (Large Language Model), que permite a interpretação de textos, casos do Bard, do Google, e do ChatGPT.
O LVM, mais sofisticado, permitirá o entendimento de vídeo.
Outra aposta do professor é o casamento definitivo entre inteligência artificial e robótica. “Hoje a IA é basicamente vista como software, mas a partir de 2024 vamos ter mais discussões sobre formas de corporificar os programas e trazê-los para o mundo físico.” Como exemplo, Rocha cita os carros se transformando em computadores sobre rodas e a evolução dos eletrodomésticos com conectividade, a Internet das Coisas (IoT).
Em parceria com a TomTom, empresa holandesa de soluções de GPS, a Microsoft lançará um assistente automotivo alimentado por IA, que terá interação de voz mais natural, além de controlar funções diversas, como abrir janelas.
A Mercedes-Benz também anunciará uma nova versão em janeiro: o assistente virtual promete empatia, a partir de uma IA alinhada ao estilo de condução e humor do motorista.
“Se uma ferramenta pode ajudar a descobrir uma vacina ou um medicamento novo, temos de entendê-la melhor.”
Anderson Rocha, coordenador do laboratório de IA da Unicamp
À brasileira
O Brasil é o quinto país do mundo em número de usuários de IA, mas ainda está fora do eixo do controle da tecnologia.
Mesmo que a inteligência artificial esteja nas mãos de apenas nove big techs entre EUA e China, modelos europeus e de código aberto estão em ascensão.
Enquanto Meta e IBM inauguram a The AI Alliance para o desenvolvimento de uma IA aberta, a startup francesa Mistral acaba de lançar o primeiro modelo da União Europeia.
O grupo de países já firmou o acordo AI ACT para regular a tecnologia a partir de 2024.
“Haverá uma explosão na discussão sobre considerações éticas e mitigação de vieses em IA”, diz Rocha.
No Brasil, o PL 2338 de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para regulação da área tramita no Senado e o presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP-AL) já anunciou que quer aprovar um projeto que regule a IA, por conta de fake news e deep fake, ainda no primeiro semestre.
O Brasil deve se inspirar no contexto europeu, adaptado à realidade de país em desenvolvimento. “Esse caminho se mostrou bastante inteligente ao não limitar o desenvolvimento da tecnologia em si, mas tratar seu uso para situações que possam prejudicar grupos, principalmente os minoritários. O Brasil não pode se furtar dessa discussão”, alerta Rocha.
A IA deverá dinamizar a inovação e estimular o crescimento de outros setores
No último dia 11, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) anunciou a revisão da Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA). “Nossa meta é alinhar objetivos, eixos e ações com a visão do governo e promover o desenvolvimento de uma cadeia produtiva relacionada à IA que dinamize a pesquisa e a inovação, e estimule o crescimento de outros setores da economia, como a indústria de semicondutores e a produção de computadores de alta capacidade”, diz a nota oficial enviada à ISTOÉ.
Após reunião com acadêmicos para debater prioridades e apresentar propostas de apoio e investimentos do governo brasileiro, serão realizadas oficinas para ouvir todos os setores da sociedade civil, além de uma consulta pública. O processo deve ser concluído até maio de 2024.
Com o Brasil na presidência do G20, o tema seguirá como prioridade, sob responsabilidade do MCTI. “O foco é pesquisar como a inteligência artificial poderá auxiliar no desenvolvimento sustentável e na redução das desigualdades”, diz a nota. Rocha conclui com uma questão estratégica: “Para que a IA seja grande aliada, precisamos saber o que queremos dela para o País”.