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União Brasil, hoje no governo, pode voltar à órbita de Bolsonaro

Criado a partir da fusão entre o PSL e o DEM, o União Brasil antecipa para fevereiro a convenção inicialmente prevista para maio. Parte da sigla defende que Antônio Rueda assuma o comando da legenda em substituição a Luciano Bivar, que tenta manter o partido na base do governo

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Antônio Rueda: grupo ligado a ACM Neto (BA) espera mais espaço no partido caso advogado seja confirmado na presidência (Crédito: Divulgação)

Por Gabriela Rölke

Numa tentativa de levar o União Brasil, partido resultante da fusão do PSL com o DEM, mais para a direita no espectro político e até mesmo de reaproximá-lo do bolsonarismo, parte da legenda se articula para que o advogado Antônio Rueda assuma a presidência da sigla do lugar do atual presidente, o deputado Luciano Bivar (PE), que presidia o PSL na época da fusão e que passou a comandar a nova sigla.

A pressão para que Bivar deixe o comando da legenda em benefício de Rueda, atualmente na vice-presidência, vem da ala ligada ao antigo DEM – foi esse grupo, coordenado por ACM Neto, que articulou a antecipação da convenção partidária de maio para fevereiro, para que a sucessão possa se dar o quanto antes.

Sob o comando do pragmático Bivar, aliado do Palácio do Planalto independentemente de quem seja seu inquilino, o União, hoje, tem três ministérios no governo Lula. Mas com a ascensão de Rueda, a ideia é que a sigla reavalie essa proximidade, caminhe para uma certa “independência” em relação ao governo e retome, em especial, pautas conservadoras nos costumes.

Diferentemente de Bivar, que conduz o partido com mão de ferro, Rueda é visto como alternativa para pacificar o conflito entre as duas correntes: mais afeito ao diálogo, garantiria mais espaço para a ala egressa do DEM nas discussões sobre os rumos do partido.

Representantes do antigo PSL veem uma tentativa de levar o partido para a extrema-direita. “Tem aumentado o tensionamento para que Bivar deixe o comando do partido porque ele é linha-dura, não deixa as coisas saírem dos trilhos”, diz um deles. “Existe uma pressão interna para que o União se aproxime da extrema-direita, mas Bivar é um democrata, dialoga com Lula e compreende o perigo de permitir essa guinada num momento ainda muito delicado para a democracia, já que o bolsonarismo continua vivo e ativo”.

Ele faz ainda um paralelo com a atuação, no Congresso, dos parlamentares do PL, partido do ex-presidente Bolsonaro e para onde foram seus apoiadores mais aguerridos, no Congresso. “Eles têm uma bancada enorme, de 99 deputados, e um discurso radicalizado, afrontoso. Imagina se os 59 deputados do União seguem o mesmo caminho: o debate na Casa fica inviabilizado”, explica.

O União elegeu 64 congressistas em 2022, 59 deputados federais e cinco senadores, e recebeu R$ 468 milhões dos cofres públicos a título de fundo eleitoral e fundo partidário.

Ilusão

Ainda de acordo com essas lideranças, seria ilusório imaginar que a condução de Rueda à presidência leve o grupo de Bivar a perder o comando do partido, já que os dois são bastante ligados. “Rueda tem outro perfil, é um ótimo interlocutor de bastidor, dialoga bem com todo mundo, convive bem inclusive com esse pessoal que questiona a liderança de Bivar”, justifica um parlamentar do grupo. “Na cabeça de quem quer a troca de comando no União, ele pode parecer mais flexível do que o atual presidente, mas duvido que o grupo de Bivar vá perder o comando da sigla. Até porque os dois são muito ligados, e Rueda também é bastante pragmático: tem a compreensão de que o melhor para o partido seria se manter exatamente onde está hoje”.

Luciano Bivar, presidente do União Brasil (Crédito:Pedro França/Agência Senado)

“Não tem nada disso, tanto que a aprovação da mudança da data da convenção se deu por aclamação.”
Luciano Bivar, presidente do União Brasil

O próprio Bivar nega que o partido esteja se movimentando para a direita, diz que não há crise interna ou questionamentos a sua liderança, e minimiza a antecipação da convenção, manobra cujo principal objetivo seria retirá-lo do comando da legenda. “Não tem nada disso, tanto que a aprovação da mudança da data da convenção se deu por aclamação, inclusive com o meu apoio”, garante.

Segundo ele, o objetivo é deixar claro o posicionamento do partido antes da janela partidária. “No ano que vem tem eleições municipais, e os prefeitos e pré-candidatos querem ter uma confirmação sobre a linha do partido para poder definir com segurança suas estratégias”, diz.

Por outro lado, parlamentares que acompanharam as articulações e que se opõem ao comando de Bivar dizem que, ao perceber que não teria força para evitar a antecipação da convenção, ele aderiu à movimentação para não se mostrar fragilizado.

Essas lideranças também dizem que a permanência do deputado pernambucano no comando do União pode resultar numa debandada de parte dessa ala do partido.

“O Luciano é uma pessoa afável e educada no trato pessoal. Mas é autoritário na condução do partido. E o pior: é desleal. Combina e desfaz pontos combinados com a maior facilidade”, afirma um deputado do grupo. “Nossa aposta no nome do Rueda é a mudança possível, a ser feita da forma menos abrupta, para não aumentar ainda mais as fissuras internas”. A ver se vai ser possível pacificar um partido que surgiu grande, mas que já nasceu cindido.