Faixa de Gaza à brasileira

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Germano Oliveira: "O Rio está praticamente conflagrado e não é de hoje. O crime organizado tomou conta da cidade" (Crédito: Divulgação)

Por Germano Oliveira

Quem ligou a TV na tarde de segunda-feira, 23, teve a impressão de que o Rio de Janeiro havia se transformado na Faixa de Gaza brasileira, guardadas as devidas proporções, claro. Dezenas de ônibus em chamas causadas por incêndios criminosos.

Trens e estações depredadas. Mais de um milhão de pessoas atônitas, com o medo estampado em seus semblantes e sem poderem voltar para casa. Cenas de guerra semelhantes às que acompanhamos ao vivo diretamente do Oriente Médio. Os ataques desta vez, porém, não foram provocados pelo Hamas, mas por milicianos armados e classificados pelo governador Cláudio Castro como terroristas, numa reação à morte de um dos chefes da facção criminosa num confronto com a polícia.

O Rio está praticamente conflagrado e não é de hoje. O crime organizado tomou conta da cidade. Na década de 1970, os bandidos do estado, detidos no Presídio da Ilha Grande, onde estavam os presos políticos, aprenderam táticas de guerrilha e a realizar grandes assaltos a banco. Anos depois, se transformaram em traficantes de drogas e armas, organizados em torno do Comando Vermelho, que dominou o cenário carioca, mas que ultimamente se vê fustigado pelo PCC paulista, que migrou para o estado vizinho com o objetivo de ampliar seu poder territorial.

Na disputa pelos pontos de drogas nos morros, os bandos promovem tiroteios diários e as vítimas são os inocentes das comunidades periféricas, principalmente crianças mortas por balas perdidas. Boa parte da polícia se envolve com esses grupos, desvia drogas apreendidas e as revendem para os traficantes, num círculo vicioso que faz do Rio terra de ninguém.

De alguns anos para cá, a banda podre da polícia percebeu que poderia ganhar mais do que simplesmente dar cobertura aos integrantes das facções e montou suas próprias estruturas, como o “escritório do crime”, responsável pela coordenação dos milicianos que dividem o poder na periferia com os traficantes. As milícias atuam especialmente na Zona Oeste. Os policiais bandidos que compõem esses grupos paramilitares dominam o comércio ilegal de gás, gato-net e mercado imobiliário, enquanto os traficantes se dedicam ao comércio de drogas. E foi nessa região onde a polícia do bem matou na segunda-feira, 23, Matheus da Silva Rezende, o Faustão, chefe da milícia local, provocando a onda de retaliações do crime organizado contra o Estado.

O pior de tudo é que o governo estadual se mostra impotente para resolver a crise. Faz uma política de enxuga gelo. Mata ou prende alguns líderes desses bandos, mas logo surgem centenas de jovens como peças de reposição, enquanto o governo federal age como se nada tivesse com isso. No máximo, manda ao Rio alguns militares da Força Nacional, que por lá ficam alguns dias e voltam sem sequer conhecer a Linha Vermelha.