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“Os carros elétricos chineses vão dominar o mercado brasileiro”, diz Alexandre Baldy, da BYD

Crédito: Alberto Rocha

Alexandre Baldy, conselheiro especial da BYD no Brasil: “O que fez os olhos dos chineses brilharem foi Lula dizer que vai privilegiar indústrias voltadas para a descarbonização” (Crédito: Alberto Rocha)

Germano Oliveira

Os veículos chineses estão chegando e é bom a indústria automobilística nacional abrir o olho. A BYD, a maior produtora mundial de carros elétricos, com a fabricação até aqui de 5,5 milhões de unidades, das quais 2 mil por mês comercializadas em território nacional, vai instalar sua montadora de veículos eletrificados na cidade de Camaçari, na Bahia, ocupando o parque fabril que era usado pela Ford para fabricar o EcoSport e a família Ka, linhas desativadas com a desistência da montadora americana pelo mercado doméstico.

A pedra fundamental da nova fábrica chinesa será lançada este mês e a previsão é que dentro de 12 ou 15 meses a unidade já dê início à produção anual de 150 mil automóveis. Os chineses investirão R$ 3 bilhões no projeto, que teve a benção tanto de Lula quanto do presidente chinês Xi Jinping, em negócio sacramentado quando o petista esteve na China em abril.

Os asiáticos fabricarão aqui o BYD Dolphin, que já está chegando ao Brasil por meio de importação, ao preço de R$ 149 mil. “Esse preço já é bem acessível ao consumidor, por se tratar de um automóvel que tem alta tecnologia e componentes bem mais avançados do que os carros vendidos aqui”, diz Alexandre Baldy, conselheiro especial da BYD no Brasil, prometendo que já no ano que vem os carros elétricos chineses chegarão aqui a preços de R$ 100 mil, ainda mais em conta.

A BYD, empresa chinesa que o senhor dirige no Brasil, pretende investir R$ 3 bilhões para produzir 150 mil veículos elétricos na antiga fábrica da Ford em Camaçari (BA). A BYD pretende dominar o mercado brasileiro de carros eletrificados?
Se considerarmos o mês de agosto, a BYD já foi a empresa que passou a dominar a primeira, segunda e terceiras posições de vendas de carros elétricos no Brasil. No final de setembro, a BYD já se tornou a maior empresa vendedora de carros elétricos do País. Passamos a Volvo e hoje o BYD Dolphin é o carro elétrico mais vendido aqui. Portanto, a BYD pretende, dentro de cinco anos, se fixar entre as três maiores montadoras de carros de um modo geral — já que na fábrica da Bahia produziremos modelos híbridos e elétricos.

Há informações de que os chineses da BYD lançarão a pedra fundamental da fábrica na Bahia neste mês de outubro. Em quanto tempo essa unidade já estará em produção?
Nossa expectativa é que entre 12 a 15 meses já estejamos produzindo os primeiros carros da BYD totalmente elétricos e também os híbridos (elétricos e movidos a álcool).

Como será esse carro híbrido?
Em Camaçari, produziremos o BYD Dolphin, que já é o carro elétrico mais vendido no Brasil hoje. E fabricaremos também um automóvel que funcionará com a bateria para o elétrico e que também terá motor flex-fuel, que funcionará com etanol. Vai ser o primeiro carro híbrido plug-in, que se carregará com as baterias e com etanol com flex-fuel produzido no Brasil.

“No final de setembro, nos tornamos a maior empresa vendedora de carros elétricos do País. Passamos a Volvo e hoje o BYD Dolphin já é o carro elétrico mais vendido aqui” (Crédito:Myo Kyaw Soe)

Qual é a autonomia desse automóvel?
No caso do híbrido, ele terá autonomia de 1.200 quilômetros, como hoje o BYD Song já possui. Mas vamos diferenciar os dois modelos que estamos falando. No carro 100% elétrico, que é o Dolphin, precisamos carregar a bateria, que tem autonomia de 400 quilômetros para uma carga completa. Ou seja, para rodar 400 quilômetros, é preciso completar a bateria com algo em torno de R$ 35, considerando o kWh médio no Brasil. Portanto, é o que temos hoje de autonomia completa de um carro 100% elétrico. Quando se fala de um carro híbrido, temos o custo com o carregamento da bateria, além do custo com o combustível que será gasto para se atingir o restante do percurso. Neste caso, poderá se optar por um flex-fuel, abastecido com gasolina ou etanol — este, então, será o primeiro carro híbrido plug-in, em que se carrega a bateria e se usa o combustível produzido no País.

Qual é o preço do Dolphin que já está sendo vendido aqui?
Hoje ele é comercializado no Brasil por R$ 149 mil, que é um preço acessível. Mas, se comparado com os demais veículos montados aqui, o Dolphin tem tecnologia de carros de elevado padrão. Ao se adquirir um BYD Dolphin tem-se acessórios que só outros modelos bem mais caros possuem.

Os componentes serão totalmente chineses ou haverá uma grande quantidade de autopeças fabricadas aqui?
Já estamos dialogando com a indústria brasileira de autopeças para ver quais componentes poderão ser fabricados por aqui. O desejo é que possamos atingir, sim, uma verticalização completa: trazer para a Bahia as empresas de peças para que se tenha um carro fabricado com componentes totalmente locais.

A vice-presidente da BYD, Stella Li, disse que pretende transformar Salvador em uma espécie de “Vale do Silício brasileiro”. A região terá elevados índices de tecnologia na América do Sul?
Exatamente. O carro híbrido, o flex fuel, já é reflexo desse desejo da Stella Li de fazer de Salvador o nosso centro de pesquisas para o mercado brasileiro e para a América Latina. Para se ter noção, a BYD tem em seu quadro de funcionários 90 mil engenheiros e pesquisadores trabalhando na China. O nosso desejo é fazer também um centro de pesquisa e desenvolvimento em Salvador, para que possamos ter a interação do centro de pesquisa e desenvolvimento da China com cientistas e engenheiros brasileiros, desenvolvendo aqui um corpo de técnicos completamente local. Inicialmente, teremos cinco mil operários contratados no Brasil.

A BYD tem projeto de destinar parte da produção local para exportação de carros elétricos para a América Latina?
Esse é o nosso objetivo. Hoje, a BYD cresce nos países da América do Sul e Latina. Fazer da Bahia o hub de produção para os carros que são comercializados no Brasil, América do Sul e Latina é o nosso projeto.

Essa será a maior fábrica chinesa de automóveis elétricos fora da China? Por que o Brasil foi o escolhido?
Vai ser a maior planta industrial da BYD fora da Ásia. E isso aconteceu em função dos propósitos do governo. Na visita do presidente Lula em abril à China, ficou claro que o objetivo da agenda política pública nacional é a transição energética. É óbvio que o País tem uma matriz energética fortemente convergente com essa política adotada pela BYD. Mas o que fez os olhos da BYD brilharem foi, realmente, o presidente Lula colocar que a política pública do governo vai ser, sim, a de privilegiar indústrias inovadoras, que investem em tecnologia e, sobretudo, que contribuam para a descarbonização do País.

Há países da Europa que prevêem que os carros movidos a combustíveis fósseis deixarão de existir até 2030. O senhor acha que é o caso do Brasil também?
Creio que o Brasil, certamente, deixará de produzir carros movidos a combustíveis fósseis a partir de 2030 pelo fato de que a descarbonização está na agenda do governo, especialmente porque o País também já detém tecnologia verde, que é o etanol. O Brasil tem um componente adicional que permite criar um objetivo como esse, num prazo médio, para que possamos ter consumo de combustíveis apenas por meio de carros elétricos e híbridos, que sejam completamente descarbonizados.

A Anfavea, associação dos fabricantes brasileiros de veículos, afirma que a chamada invasão chinesa está prejudicando seus projetos de investimentos para o futuro. Isso significa que eles querem reserva de mercado, como aconteceu no passado e que deixou a indústria automobilística nacional defasada por décadas?
O Brasil precisa ter um planejamento claro, que já foi demonstrado pelo presidente Lula na visita à China. Uma agenda que possa atrair investimentos comprometidos com o meio ambiente, inovação e uma nova indústria para o setor automotivo — um segmento caro ao presidente da República. A BYD é a empresa mais inovadora que tem corpo de funcionários com a maior quantidade de pesquisadores e engenheiros. É a maior empresa que fabrica carros elétricos no planeta. Portanto, completamente convergente com a política atual do governo federal. Um País que tem a Amazônia e será a sede da COP30, e que, certamente, não quer ficar ultrapassado num segmento que é a paixão do brasileiro: o setor automotivo.

Quanto à questão da carga tributária, o Congresso brasileiro está votando uma reforma com a previsão de tornar o custo Brasil um pouco menor para os investidores que desejam aplicar seus recursos aqui. Os chineses estão ampliando seus investimentos no Brasil em razão dessa carga menor de tributos?
A gente tem um problema pois a carga tributária ainda é muito alta no Brasil, embora a Reforma Tributária objetive deixar esse peso um pouco mais leve. A própria Stella Li, que é a nossa CEO das Américas, foi clara em sua vinda em junho ao Brasil. A complexidade tributária brasileira é um dos fatores que complicam esse entendimento por parte das organizações internacionais, já que ela prejudica a atração de investimentos das empresas comprometidas com o crescimento e acessibilidade de inovações tecnológicas para o consumidor brasileiro. Então, por várias razões, a complexidade de todo o sistema tributário é realmente um complicador para a decisão de investimentos de empresas internacionais do Brasil.

Um dos fatores do encarecimento do carro elétrico no Brasil é a falta de plugs de tomadas de energia elétrica em todo o País, que tem dimensões muito grandes. É fato que a BYD está tentando conseguir um financiamento do BNDES para ampliar a rede de energização em todo o Brasil?
Exatamente. Estamos estimulando o BNDES a investir no setor. Tivemos reunião para apresentar o plano de expansão da infraestrutura para acolher o crescimento do mercado de veículos elétricos no Brasil. A BYD também estimula esse segmento, tanto que investe em startups para carregadores de carros elétricos nas vias urbanas e rodovias do Brasil. Além disso, estamos dando isenção por cinco anos na revisão e manutenção dos carros elétricos comercializados aqui. Justamente para que consigamos atrair o olhar do poder público. Para que nas esferas municipais e estaduais, assim como já está na agenda federal, consigamos promover — como no caso do BNDES — recursos para alavancar e fazer crescer essa infraestrutura nas cidades e nas rodovias. Sobretudo, para esse estímulo de políticas públicas nas vias por meio de prefeituras. Para que o mercado, obviamente, e as condições de infraestrutura estejam adequadas para esse crescimento.

“A fábrica da BYD em Camaçari será nossa maior planta fora da Ásia. E isso aconteceu graças aos propósitos da transição energética apresentados por Lula na visita a Xi Jinping em abril” (Crédito: Ricardo Stuckert/PR)

Como o senhor avalia o governo brasileiro em termos de ampliação dos negócios com os chineses no Brasil? As boas relações de Lula com Xi Jinping têm ajudado a melhorar o intercâmbio comercial entre os dois países?
Nesse aspecto de crescimento e desenvolvimento do mercado, o presidente Lula tem feito uma agenda que contribui para que o Brasil possa receber investimentos, crescer, desenvolver e gerar empregos. Então, o presidente tem realizado uma agenda realmente voltada para o crescimento e o progresso.

O apoio do PP, do qual o senhor faz parte, tem sido fundamental para que Lula tenha condições de governabilidade?
Com toda certeza. O presidente da Câmara, Arthur Lira, que é líder do Partido Progressista, tem dado toda a contribuição para que a Reforma Tributária seja aprovada no Congresso e que a PEC da Transição também tenha sido aprovada, dando condições fiscais para que o governo pudesse governar ao longo de 2023. Essa estabilidade permitiu também a aprovação do novo marco fiscal na Câmara e viabilizou que pudéssemos, então, avaliar a recuperação fiscal, econômica e, sobretudo, o desenvolvimento e geração de empregos.