Comportamento

Colesterol: procura por medicamento cresce e preocupa médicos

Mais de um quarto das crianças e adolescentes do Brasil apresentam níveis considerados acima do normal. A procura por medicamentos aumentou 22% e os pais tentam reverter a situação com mudança de hábitos em família

Crédito: Rogério Cassimiro

A estudante Debora Alionis Banzatto: colesterol elevado na infância controlado na adolescência após mudança no estilo de vida (Crédito: Rogério Cassimiro)

Por Elba Kriss

Há pouco mais de seis anos, um exame de rotina surpreendeu a funcionária pública Andrea Alionis Banzatto, de 52 anos, moradora em São Bernardo do Campo, região do ABC paulista. A filha Debora Alionis Banzatto, então prestes a completar 10 anos, apresentou colesterol elevado. “Estava acima do limite para uma criança. Fiquei preocupada. Para mim, ela não tinha o perfil que me levasse a desconfiar que isso seria possível”, diz Andrea. Ao procurar um endocrinologista, a investigação deu a resposta: o caso era um exemplo de hipercolesterolemia familiar, quando o aumento do colesterol LDL pode ter origem genética. A própria Andrea tem alterações em suas taxas. Debora passou a usar medicação, o que controlou a questão juntamente a comportamentos ainda mais saudáveis, pois ela já se alimentava bem.

27,47%
de crianças e adolescentes têm níveis altos de colesterol

“Procuramos uma nutricionista e a família inteira mudou os hábitos. Fizemos trocas simples como cortar fritura, optar pelo leite desnatado e açúcar demerara”, narra a mãe.

O remédio, por sua vez, não era do agrado. “Eu tomava sempre antes do almoço e do jantar. Lembro que quando brincava no playground do prédio e dava a hora da refeição, eu voltava para casa só para tomar o comprimido”, conta Debora.

Mãe e filha consultaram outros pediatras e foram apresentadas ao fitoterápico e, em seguida, ao teste sem medicação. Com seus atuais 16 anos, ela não necessita de tratamento farmacológico, mas segue firme com o que assimilou na infância. “Foi um alívio não ter que tomar mais o medicamento. Hoje em dia me alimento bem em casa e na escola. E gosto de ir à academia, o segredo é equilíbrio”, diz a estudante.

A narrativa é a realidade de uma parcela das crianças e adolescentes do Brasil. Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais constatou que mais de um quarto desse grupo (27,4%) têm colesterol alto e 19,2%, um em cada cinco, alteração no LDL, também conhecido como “colesterol ruim”.

Esse número considerável difere do caso de Debora, pois têm relação com a péssima alimentação e hábitos prejudiciais da atual geração. “Diversos aspectos são capazes de alterar o nível de colesterol no sangue, e muitos fatores de risco são modificáveis com mudanças no estilo de vida. A pesquisa mostrou que o alto consumo de ultraprocessados é intensificador. É preciso, portanto, reduzir isso. A prática de atividades físicas e a diminuição do tempo de uso de aparelhos eletrônicos são medidas auxiliares na prevenção do problema”, considera Thales Philipe, um dos autores da pesquisa.

20%
de alta na procura de remédios em São Paulo

Uma consequência dessa realidade aparece em outro levantamento preocupante: houve aumento médio de 22% na venda de medicamentos para o controle do colesterol no período de agosto de 2022 a julho de 2023, em comparação aos 12 meses anteriores. A análise feita pela InterPlayer, hub de negócios da saúde e bem-estar, constatou ainda que São Paulo teve 20% de acréscimo e o Rio Grande do Sul registrou 9,3%. Amazonas foi o único com queda de 4%.

“O índice de adultos, adolescentes e até mesmo crianças com altas taxas em nosso País é preocupante e explica o crescimento nas vendas. Segundo o Ministério da Saúde, essa condição contribui para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Felizmente, o aumento do colesterol pode ser controlado por meio de remédios específicos, dieta equilibrada e atividade física”, diz Ilo Aragão, gerente da InterPlayers.

Mudanças simples, de fato, são o melhor remédio. Em São Paulo, os exames de Manuella Cardoso detectaram pequena elevação em seu índice. Ela tinha três anos. “Teve uma fase em que ela só queria fritura”, lamenta a avó Rose Cardoso. “Conseguimos controlar com frutas, verduras e legumes. Não foi preciso entrar com medicação”, comemora a dona de casa. Aos seis, a menina não tem alterações nesse ponto.

Farmácias: procura por medicamentos para colesterol alto preocupa ala médica (Crédito: Evandro Leal)

“As estatinas, principais medicamentos utilizados para o colesterol muito alto — acima dos 170 ou 190 para crianças com fatores de risco — têm indicações precisas porque há efeitos colaterais. A prescrição em crianças não é universal”, observa Debora Passos, pediatra e nutróloga da UTI Neonatal do Hospital e Maternidade Pro Matre.

A profissional destaca que educação alimentar e mudança no estilo de vida são fundamentais mesmo sem qualquer diagnóstico. “Um alerta que dou aos pais no consultório é o seguinte: a introdução alimentar aos seis meses de idade, é a hora de eles reverem seus proprios hábitos. Não adianta oferecer legumes e verduras para o filho se, na verdade, não é essa a alimentação da família. É importante incentivar a atividade física e os esportes, tirá-las do sedentarismo o máximo possível”, finaliza.