Internacional

Biden vai até o fim?

Problemas legais do filho e ameaça de impeachment pioram a perspectiva de reeleição do presidente americano. Democratas apoiariam um outro candidato em 2024, mas enfrentam um problema: ele ainda é a melhor opção para derrotar Donald Trump

Crédito: Kevin Dietsch

"Estou concorrendo porque a democracia está em jogo", disse Joe Biden, presidente americano, em 18 de setembro, emendando que Donald Trump e seus aliados “estão determinados a destruí-la” (Crédito: Kevin Dietsch)

Por Denise Mirás

Ruim com ele, pior sem ele. É o dilema que os democratas americanos enfrentam no momento com relação a Joe Biden, determinado a disputar a reeleição à Presidência dos EUA em 5 de novembro de 2024. De acordo com o site FiveThirtyEight (538 é o número de membros do Colégio Eleitoral americano), especializado em pesquisas e análises, 82% dos democratas gostariam de contar com um candidato diferente. Mas 66,9% endossam Biden porque ele seria o único capaz de derrotar o arqui-inimigo Donald Trump — se o ex-presidente escapar de processos que o tornem inelegível e da cadeia.

Curioso é que, da mesma forma, muitos dos republicanos preferiam ter outro nome forte além de Trump, mas também se mostram resignados: 55,5% acreditam que a maior chance de vitória é com a candidatura do ex-presidente.

Sobre a pressão contra a candidatura de Biden dentro do próprio Partido Democrata, Rodrigo Amaral, doutor em Relações Internacionais e professor da PUC-SP, lembra que pode haver insatisfação, mas o lado pragmático ganha. “Até Bernie Sanders, que foi candidato da terceira via mais à esquerda americana, já falou que o momento é de união, de combate ao ‘fascismo gângster do Trump’, e ‘Biden é o que se tem para hoje’.”

Os problemas de Biden são grandes.
* O primeiro diz respeito à idade: está com 80 anos e muitos questionam se conseguirá se manter apto para mais quatro anos de mandato. “É o etarismo usado como ferramenta para desqualificar o presidente. Os republicanos gostam de chamá-lo de Sleepy Joe, ou dorminhoco. E falam de sua gafes”, lembra o professor.
* O segundo é envolvimento em corrupção: em 12 de setembro, Kevin McCarthy, presidente da Câmara, anunciou a abertura de um processo de impeachment, que começa com uma investigação sobre possíveis irregularidades da parte de funcionário federal, seja presidente da República ou pessoal de gabinete. No caso, a Câmara (onde os republicanos conquistaram maioria) pode instaurar o processo, mas é o Senado que tem o poder de condenar e destituir (hoje, por trabalho e sorte de Biden, são 52 senadores democratas contra 48 republicanos).

Hunter Biden volta à cena como suspeito de corrupção protegido pelo pai (Crédito:Drew Angerer)

A meta de McCarthy é reinvestigar os negócios de Hunter Biden, filho do presidente, que na opinião do deputado sugerem “uma cultura de corrupção” por parte da família.

Em 2019, houve a denúncia de que Joe Biden tentou impedir investigação na Burisma, empresa ucraniana de petróleo e gás, onde o filho era membro do conselho.

Mas depois de oito meses a denúncia foi arquivada pelo Departamento de Justiça por “evidências insuficientes”. Uma nova investigação, segundo Rodrigo, é uma tentativa desesperada dos republicanos, “porque o apelo deles é bem vazio”.

A perspectiva do lado dos republicanos não é tão diferente, como destaca o professor: “Adorariam uma alternativa, mas precisam de alguém que consiga votos. Por isso, Trump talvez tenha até mais apoio do que na eleição passada. Claro que sua candidatura dependerá das acusações em processos agora em julgamento, que podem ajudar Biden. Mas também atrapalhar o atual mandatário, se Trump sair ileso e os democratas não tiverem uma carta-resposta na manga”.

Animal político

Por enquanto, contam com o marketing do livro-reportagem The Last Politician (de Franklin Foer) em favor de Biden, como observa Rodrigo.

“Foi bem divulgado nos EUA e mostra o presidente como político de carreira, desde a década de 1970, o que é uma cutucada em Trump — que muito antes de ser político, é empresário.”

O livro, diz o professor, apresenta Biden como alguém sério, que mesmo não sendo popular é confiável para recuperar a economia americana e ainda cuidar da ordem internacional em meio a uma crise hegemônica e diante de questionamentos de emergentes como o Brasil.

“Biden participou de importantes processos da história americana e neste momento até conseguiu trazer prisioneiros do Irã sem uma postura muito agressiva.”

Em uma eleição que, com Trump, seria extremamente equilibrada, continua Rodrigo, há o argumento de que Biden consegue conduzir as coisas bem, “mesmo que em banho-maria”, sem levar os EUA a uma crise profunda. E há o contraponto de que “do jeito que está não está bom”, que “Trump tentou mexer mas não deixaram” e por isso deve-se tentar novamente. “São essas as duas narrativas que estão no cenário americano, pelo menos agora, a pouco mais de um ano das eleições presidenciais.”