Cultura

Clima: a ‘bíblia’ de Greta Thunberg sai do forno

Organizado pela ativista sueca Greta Thunberg, 'O Livro do Clima' reúne artigos de especialistas, cientistas e personalidades mundiais sobre o caos provocado pelas mudanças no meio ambiente. Há diversas opiniões e um único consenso: a chance de salvar o planeta diminui a cada dia

Crédito: Justin Tallis

Greta Thunberg: “Temos pouco tempo para evitar o pior. Há esperança, mas apenas se mudarmos de rumo já” (Crédito: Justin Tallis)

Por Felipe Machado

“Para resolver um problema, precisamos entendê-lo.” A frase aparentemente óbvia batiza o primeiro capítulo de O Livro do Clima, antologia sobre a situação atual do meio ambiente organizada pela ativista Greta Thunberg. Apesar de seu nome funcionar como um ímã midiático, a popular jovem sueca de 20 anos não tem a pretensão de resolver sozinha os complexos problemas do planeta, muito menos explicá-los. Apesar de ser responsável por alguns textos, seu grande mérito é usar a popularidade global para divulgar um trabalho científico de peso: são quase 500 páginas com dados, gráficos e artigos assinados por mais de cem especialistas no assunto, entre eles:
* cientistas,
* políticos,
* professores de universidades renomadas,
* ambientalistas,
* membros de organizações civis.

A “bíblia de Greta”, como o livro vem sendo chamado por seus seguidores, é dividido em cinco partes temáticas.

A primeira, Como Funciona o Clima, traz argumentos que explicam de forma didática o impacto que o ser humano exerce sobre o meio ambiente. Entre os autores estão nomes como Beth Shapiro, biologista especializada em evolução molecular e professora da Universidade da Califórnia, Michael Oppenheimer, cientista atmosférico e professor da Universidade de Princeton, e Naomi Oreskes, professora de geociência da Universidade Harvard. O texto de Naomi, que assina Por que não fizeram nada?, é uma crítica incisiva aos políticos e ao sistema econômico mantido pelas grandes potências. “O capitalismo, tal como existe hoje, coloca em perigo a existência de milhões de espécies no planeta, bem como a saúde e o bem-estar de bilhões de seres humanos”, afirma ela.

Engana-se quem acredita que a opinião da acadêmica extrapola o tema por cair no viés ideológico: ela demonstra com números indiscutíveis como a indústria e o modelo extrativista dominante nos últimos 250 anos contribuíram para a destruição da natureza. “Quem ocupa posições de poder e privilégio se recusou a reconhecer as mudanças climáticas como resultantes de um modelo disfuncional”, conclui.

O capítulo seguinte, Como o Planeta está Mudando, aborda a situação brasileira por meio do relato de três pesquisadores: Carlos Nobre, presidente do Painel Científico para a Amazônia, Julia Arieira, cientista especializada em ecologia e professora da Universidade Federal do Espírito Santo, e Nathália Nascimento, geógrafa e especialista em sistemas terrestres. “Há um número crescente de sinais de que a Floresta Amazônica está perigosamente próxima de um ponto de não retorno”, diz o artigo assinado pelo trio. “A nossa estimativa é que a região pode se transformar numa savana degradada.”

O item Como Somos Afetados tem o foco voltado para a saúde e as consequências do caos climático para a disseminação de doenças. Abre com a participação de Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde. Ele alerta para os riscos sanitários que podem surgir em decorrência do caos climático: “A demora para evitar o agravamento dessas ameaças vai afetar desproporcionalmente a parcela mais desfavorecida da população mundial”. Traduzindo: as populações mais pobres vão sofrer primeiro.

Chamado à ação

Nos destaques O que Fizemos até Agora e O que Precisamos Fazer, o tom é marcado pela necessidade de união entre os importantes players mundiais. Greta abre espaço para outras vozes surgidas recentemente no campo do ativismo.

A jovem Vanessa Nakate, que liderou greves escolares pelo clima em Uganda, oferece uma perspectiva convincente sobre os desafios enfrentados pelas nações em desenvolvimento.

Varshini Prakash, cofundadora do Movimento Sunrise, aponta o caminho para uma transição justa e equilibrada para a questão das energias renováveis.

O livro apresenta ainda as ideias da cientista Dra. Katharine Hayhoe, cujo capítulo trata dos efeitos do aquecimento global nos ecossistemas; o oceanógrafo Wallace J. Nichols, que investiga os impactos das mudanças relativas aos mares e oceanos do nosso planeta; e a ecologista Aparna Krishnan, que explora as interconexões complexas entre biodiversidade e mudança climática.

Embora leve o seu nome, O Livro do Clima não é uma empreitada particular de Greta Thunberg, mas uma colaboração épica entre as mentes mais brilhantes do planeta.

Não é apenas um alerta, mas um chamado à ação coletiva. À medida que as vozes dos cientistas se fundem às paixões dos ativistas e às perspectivas pragmáticas dos políticos, a mensagem é clara: o tempo para a inércia acabou.

(Jacques Demarthon/AFP; Tolga Akmen/AFP; Scarlett Rocha/Afp; Leemage/AFP)