O país não vira a página

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Ricardo Kertzman: "O Brasil cansa um bocado" (Crédito: Divulgação)

Por Ricardo Kertzman

Ao menos desde a redemocratização, os brasileiros experimentam uma espécie de feitiço do tempo, tomando emprestado o título do filme Groundhog Day (Dia da Marmota), de 1983, com os excelentes Bill Murray e Andie MacDowell.

Para quem não assistiu, trata-se de uma comédia romântica em que o “homem do tempo” de uma pequena emissora de TV (Phil) acaba aprisionado em um mesmo dia, vivendo as mesmas cenas, encontrando as mesmas pessoas.

A primeira eleição direta pós-ditadura militar ocorreu em 1989. Fernando Collor, contudo, durou pouco, e afundado em denúncias de corrupção renunciou, em 1992, para escapar da cassação pelo processo de impeachment já aberto.

Eleito em 2002, Lula da Silva viu ruir sua imagem de homem probo ao protagonizar o escândalo do Mensalão, uma espécie de precursor do que viria anos depois. Reeleito em 2006, fez sua sucessora em 2010, deixando o governo com altíssima aprovação.

Dilma Rousseff chegou como  gerente do Brasil, ou gerenta, para quem gosta. A fisionomia fechada e uma imagem austera, porém, ruíram com o Petrolão – o maior assalto aos cofres públicos de um país em toda a história do ocidente democrático.

Impichada em 2016, após reeleita em 2014, assistiu a seu vice-presidente, Michel Temer, ser flagrado em conversa nada republicana com um empresário corrupto: “Tem de manter isso aí, viu?”. Afora o bunker de Geddel, com 52 milhões de reais em espécie.

Temer chegou a ser preso em 2019, mas não foi o primeiro. Lula – sim, Lula, o mesmo de 2002 e 2006; e o mesmo de agora, 2022 – já havia trilhado o caminho para uma confortável cela presidencial em Curitiba (PR), condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.

Os brasileiros experimentam uma espécie de feitiço do tempo, tomando emprestado o título do filme Groundhog Day (Dia da Marmota)

Durante os infernais últimos quatro anos (2018 a 2022), tivemos um presidente da República oriundo de rachadinhas e mansões milionárias compradas com dinheiro vivo, sem esquecer dos micheques, os milicianos amigos e a Val do Açaí.

Hoje, sabemos que Jair Bolsonaro também chafurdou, em tese, por supressão de patrimônio da União, contrabando de joias, sonegação de impostos, lavagem de dinheiro, além, é claro, conluio com hackers e tentativa frustrada de golpe de Estado.

Neste ínterim dos horrores, anões do orçamento, Aécio e o primo da mala, Sérgio Cabral, Paulo Maluf, Newton Cardoso, Anthony Garotinho, Renan Calheiros, Jader Barbalho, Edison Lobão, Roseana Sarney e Valdemar Costa Neto & José Dirceu cantando na Papuda.

Há mais de 30 anos não saímos do lugar. O Brasil cansa um bocado.

“Babe, I got you babe”.