Cultura

Série resgata os pioneiros dos palcos no Brasil

Dirigida pelo ator Roberto Bomtempo, série Companhias do Teatro Brasileiro conta a história da arte dramática nacional por meio de quinze grupos que marcaram época

Crédito: Divulgação

Teatro Brasileiro de Comédia (TBC): produção autoral e intercâmbio internacional (Crédito: Divulgação)

Por Felipe Machado

Se o teatro brasileiro tivesse um documento, sua data de nascimento seria indiscutível: 12 de abril de 1833, estreia de O Príncipe Amante da Liberdade ou A Independência da Escócia, no Theatro Niteroiense. Foi o primeiro espetáculo da Companhia Dramática João Caetano, o primeiro grupo de teatro do País. Aos vinte anos, o ator abandonara a carreira militar para se dedicar aos palcos. Caetano começou fazendo pequenos papéis nas companhias portuguesas, até que seu sucesso com o público local provocou ciúme no elenco de artistas estrangeiros. Foi expulso, mas não desistiu: fundou sua própria companhia e se tornou o pioneiro nas artes dramáticas no País.

Companhia João Caetano: grupo fundado em 1833 provocou o ciúme dos portugueses (Crédito:Divulgação)

Não há dúvida de que o teatro é um dos pilares da riqueza cultural brasileira, paixão que atravessa gerações desde o período colonial, quando os jesuítas combinaram a arte com a catequese.

Apesar da popularidade, no entanto, nunca houve um bom registro audiovisual dessa história — até agora, pelo menos. Dirigida por Roberto Bomtempo, a série documental Companhias do Teatro Brasileiro, produção do canal Curta!, retrata o tema por meio de seus grupos mais expressivos.

São quinze episódios, com 26 minutos cada, repletos por acervo de época e com mais de 70 entrevistados, entre diretores, atores, pesquisadores e críticos. Há depoimentos de Daniel Filho, Juca de Oliveira e Lima Duarte, além de nomes que já partiram, como Eva Wilma, Flávio Migliaccio e Milton Gonçalves. A pesquisa ficou a cargo do ator Daniel Marano e o conteúdo está disponível também no portal www.curtaon.com.br.

Expoentes

Na década de 1940, o Brasil vivia um período de grande efervescência cultural, e o teatro ganhava uma nova dimensão com o surgimento do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC).

Fundado em 1948, em São Paulo, o TBC rapidamente se tornou um dos principais expoentes da sua geração, reconhecido por sua busca constante pela excelência artística e inovação.

Liderado por grandes nomes como Cacilda Becker, Tônia Carrero e Paulo Autran, o TBC defendia a encenação de peças autorais, além de promover um intercâmbio cultural com importantes dramaturgos e diretores estrangeiros.

Já o Teatro Arena, outra companhia essencial para a criação de uma identidade nacional, surgiu no final da década de 1950, também em São Paulo.

Pouco tempo depois veio a ditadura militar e o Brasil entrou em um período de intensa repressão. O teatro tornou-se então uma poderosa ferramenta de resistência e denúncia dos abusos de poder.

Grandes nomes passaram por lá, como Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e Oduvaldo Vianna Filho, conhecido como Vianinha. Deixaram um legado importante por meio de peças que ainda ecoam nos corações e mentes daqueles que presenciaram suas atuações.

Relevante do ponto de vista artístico e histórico, a série mostra que o teatro brasileiro continuou a evoluir e a se reinventar até os dias de hoje, mantendo-se como uma das principais manifestações artísticas do País. Novas companhias surgiram, cada uma com sua voz e estilo, demonstrando a força da arte brasileira nos palcos.

ENTREVISTA

Roberto Bomtempo, diretor

Bomtempo: “Os grupos são reflexo da sociedade” (Crédito:Divulgação)
 
De onde veio a ideia para a série?
O registro de peças de teatro é sempre muito difícil, até porque trata-se de uma arte que acontece ao vivo, no palco. Historicamente não há muito material. Já faz alguns anos que tive a ideia de contar essa história. Foco em apenas quinze companhias, mas acredito que deu para passar o conceito de progressão dessa produção ao longo dos anos.

Olhando para essa linha do tempo, como vê a evolução?
Os grupos são um reflexo da sociedade. Não evoluíram em capacidade de produção ou verba, até porque companhias como
TBC e Maria Della Costa já tinham investidores e muito dinheiro. A mudança foi na forma de encarar o teatro como espelho de sua época.

Foi possível notar o surgimento de uma identidade nacional?
Sim, a partir dos anos 1960. Antes havia uma influência grande do teatro europeu, sobretudo francês. Surgiu então uma voz mais brasileira, que falava de coisas nossas. Grupos como Arena, Opinião e Ipanema passaram a olhar para o que estava acontecendo no País.