Quando o passado volta e condena

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Thales de Menezes: "O tenista Thiago Wild não foi julgado e talvez nem seja, mas o tribunal da internet já tem um novo 'culpado'” (Crédito: Divulgação)

Por Thales de Menezes

O tenista brasileiro Thiago Wild, de 23 anos, conquistou na primeira rodada do torneio de Roland Garros a vitória mais expressiva, e inesperada , de sua carreira. Numa batalha épica de mais de quatro horas de duração, ele eliminou o atual número dois do ranking mundial, o russo Daniil Medvedev. Desde o estrelato de Gustavo Kuerten e de alguns bons momentos da trajetória de Thomaz Bellucci, o tênis masculino brasileiro vivia um hiato de grandes resultados – as garotas vão bem, com Bia Haddad. Independentemente do que mais conseguisse conquistar nas quadras de saibro parisienses – acabou eliminado na terceira rodada –, Wild já tinha uma grande façanha para chamar de sua. Ovacionado pelo público, flutuava nas nuvens ao se dirigir para a entrevista coletiva depois da partida.

Naquele que talvez tenha sido o dia mais feliz de sua vida, deve ter sido um baque muito grande ser torpedeado por duas perguntas sobre a acusação de violência doméstica e psicológica contra a biomédica e influenciadora digital Thayane Lima.

A ex-namorada do tenista apresentou denúncia ao Ministério Público do Rio de Janeiro em junho do ano passado e o processo está em andamento. Assumindo uma indisfarçável expressão de constrangimento, Wild disse aos jornalistas que o assunto não era para ser tratado ali, e categoricamente encerrou qualquer comentário sobre o tema após duas perguntas.

Sem uma definição da Justiça sobre o caso, pode ser considerada leviana a insistência nessa discussão junto ao atleta, mas o louvável momento de confrontação clara da sociedade diante da violência imposta às mulheres não vai deixar a poeira baixar.

Thiago Wild não foi julgado e talvez nem seja, mas o tribunal da internet já encontrou um novo “culpado”

No âmbito esportivo, a recente pressão sobre a contratação do técnico Cuca pelo Corinthians é um capítulo semelhante, mas nem tanto. Cuca recebeu uma condenação na Europa, foi considerado culpado do crime de estupro e só não cumpriu pena porque, estrategicamente, não retornou à Suíça.

Wild está em outro degrau dessa condição jurídica, não foi julgado e talvez nem seja, mas o tribunal da internet já tem um novo “culpado”. A ponto de uma brincadeira muito cruel ter surgido nas redes sociais após a vitória do brasileiro. Postagens trouxeram a piada de que Wild pode até não ser um “novo Guga”, numa referência a Kuerten, mas quem sabe seja um “novo Cuca”.

Ninguém em sã consciência poderá argumentar que conquistas esportivas ou criações de grandes obras de arte podem apagar de seus autores as nódoas que casos dessa estirpe impõem em suas vidas. Resta ao público acompanhar o desenrolar de processos judiciais e ver como cada acusado consegue lidar com o fardo social que recebeu para carregar.