Cultura

Segure na poltrona: o filme-catástrofe está de volta

Mais de meio século após o lançamento de Aeroporto, o primeiro grande filme do gênero “cinema-catástrofe”, essa fórmula se renova no streaming — e continua a fascinar o público

Crédito: Divulgação

O desastre em Fukushima, mote de série da Netflix, pode ser o oxigênio que faltava para renovar o gênero cinema-catástrofe (Crédito: Divulgação)

Por Felipe Machado

No início dos anos 1970, um novo gênero cinematográfico começou a ganhar espaço em todo o mundo, atraindo multidões e quebrando recordes de bilheteria com uma premissa incomum: exibir situações extremas que colocassem em risco a vida de milhares de pessoas. Mas isso não era o suficiente — fazia-se preciso também inserir um drama humano, uma tragédia pessoal para afetar os protagonistas e criar uma empatia ainda maior com o público.

Nascia ali o “cinema-catástrofe”, um conjunto de grandes produções marcadas por cenas de ação e roteiros repletos de tensão, feitos sob medida para criar pânico e tirar o fôlego da plateia.

Aos poucos os estúdios perceberam que o formato não era apenas uma moda passageira. Passaram, então, a investir alto nesse filão.

‘Três dias que mudaram o mundo’ (2023): série japonesa mostra o acidente na usina nuclear de Fukushima (Crédito:Divulgação)

A renovação do gênero

Uma produção japonesa que acaba de estrear na Netflix mostra que o estilo se renovou. A série Três Dias que Mudaram o Mundo tem a trama baseada numa história real, direção mais próxima da linguagem dos documentários e sem os exageros de uma trilha sonora apelativa.

É inspirada no acidente que atingiu a usina nuclear de Fukushima, estrutura a apenas 225 quilômetros de Tóquio, em março de 2011. “Os corajosos funcionários precisam enfrentar um desastre sem precedentes. Será que eles são heróis ou culpados?”, indaga a sinopse. O episódio não permite uma resposta tão maniqueísta, mas se tem algo que não falta são os elementos catastróficos.

A história começa com o terremoto de Tohoku, o mais poderoso a atingir o Japão. O tremor alcançou nove graus na escala Richter, índice máximo de medição.

O pior, no entanto, ainda estava por vir. O sismo provocou um tsunami no mar da costa leste do país e uma série de ondas gigantes com cerca de quinze metros de altura cobriu todo o território. A água inundou a usina de Fukushima e provocou um vazamento radioativo que atingiu milhares de pessoas.

Por meio de efeitos especiais, o episódio é recriado na ficção com realismo impressionante. O segredo está na direção, que ficou a cargo de Masaki Nishiura e Hideo Nakata, ambos conhecidos por obras de terror como O Chamado e Água Negra. O desastre de Fukushima foi a maior tragédia nuclear desde Chernobyl, na União Soviética, em 1986. Uma prova de que as catástrofes estão em alta é que o drama soviético também rendeu uma premiada série no streaming HBO Max.

Onde tudo começou

Os primeiros filmes do gênero incorporavam elementos típicos da época, como enormes aviões de passageiros e arranha-céus. Filmes como O Destino do Poseidon (1972) e Terremoto definiram o cinema dos anos 1970. Esse último trazia à frente o produtor Irwin Allen, apelidado de “o mestre do desastre”. Após filmar Inferno na Torre, com Paul Newman e Steve McQueen como heróis, Allen lançou O Enxame (1978), com abelhas assassinas; Dramático Reencontro no Poseidon (1979), sobre mais um naufrágio; e O Dia em que o Mundo Acabou (1980), onde o antagonista era um vulcão aterrorizante.

Com o avanço da tecnologia — e dos efeitos especiais, característica essencial para a veracidade desses dramas —, as causas do medo foram mudando. Extraterrestres, meteoros e explosões atômicas passaram a ocupar o lugar e inspirar novos longas e seriados.

Já se passou mais de meio século desde o lançamento de Aeroporto. Apesar do elenco recheado de estrelas, como Burt Lancaster, Dean Martin e Jacqueline Bisset, o drama sobre o avião que podia cair em Chicago foi feito com orçamento baixo, US$ 10 milhões, menos que O Exorcista e Patton, Rebelde ou Herói?, ambos com verba acima de US$ 12 milhões.

Sua bilheteria faturou US$ 100 milhões e rendeu três continuações, em 1975, em 1977 e em 1980, cujo título homenageava a aeronave francesa Concorde. Meio século depois, no cinema ou no streaming parece que as pessoas ainda buscam as mesmas intensas e extremas emoções.

Medo e situações extremas

Ameaças que podem colocar em risco a humanidade servem de inspiração para Hollywood desde os anos 1950, com produções apocalípticas como Guerra dos Mundos e Godzilla. Ao longo das décadas, o estilo foi sendo aprimorado e gerou clássicos que ainda nos provocam pavor