Comportamento

Carro elétrico: a difícil transição para a sustentabilidade

Noruega ultrapassa 80% de carros elétricos vendidos no país e enfrenta problemas de infraestrurura para um novo modelo. O Brasil, ainda com uma frota eletrificada de apenas 3%, já pode aprender com os problemas de lá

Crédito: Istockphoto

Carro recebe carga enquanto estacionado em rua de Oslo, que não tem oferta suficiente de abastecimento (Crédito: Istockphoto)

Por Thales de Menezes e Carlos Eduardo Fraga 

Nos últimos 12 meses, 80% das vendas de carros na Noruega foram de modelos elétricos, colocando o país na vanguarda da mudança para a mobilidade movida a bateria. É estimado que na capital, Oslo, a frota que se carrega na tomada ultrapasse 90%. As cidades menores ainda concentram carros mais velhos, com motor de combustão. A partir de 2025, os noruegueses ficam proibidos de comprar ou importar carros movidos a combustível fóssil.

Os números retratam enorme avanço na busca de energia limpa, mas o país enfrenta dificuldades nessa transição. Mesmo em um território pequeno, há alguns nós de infraestrutura para desatar, incluindo ausência de eletropostos suficientes e longas esperas em horários de alta demanda.

O Brasil, muito longe do patamar da Noruega na eletrificação veicular, pode aprender com os problemas dos europeus e antecipar soluções para o futuro.

Segundo André Campos, sócio e CEO da For You Fleet, empresa de soluções em locações de veículos e terceirização de frotas, o Brasil deve chegar a 20% de carros elétricos na frota em 2040, contra pouco menos de 3% que apresenta hoje. Para ele, o crescimento será lento, com a necessidade de superar problemas como acesso a recarga ao longo do País e o preço do carro elétrico, hoje com os modelos mais acessíveis por R$ 200 mil.

“Em 2022, a gente teve um crescimento de 41% nos carros elétricos ou híbridos em relação a 2021, superando 40 mil unidades produzidas e emplacadas, o que representa 3% do total. No primeiro quadrimestre deste ano, em relação ao anterior, o aumento foi de 51%, sendo que o mercado global cresceu apenas 35% nesse mesmo período. Assim, o Brasil está crescendo mais rápido do que a média mundial”, analisa Campos.

Motorista carrega bateria do veículo na rodovia, em raro posto a 70 km da capital norueguesa (Crédito:Divulgação)

Na Noruega, as emissões de gases de efeito estufa de Oslo caíram 30% desde 2009, não houve desemprego em massa entre os trabalhadores dos postos de gasolina e a rede elétrica não entrou em colapso. No entanto, o dia a dia dos motoristas é afetado.

Enquanto um carro a gasolina completa seu tanque em cerca de dois a três minutos, a carga completa de um elétrico por levar 12 horas. Isso obriga a pessoa a introduzir uma nova e demorada rotina.

O ideal é carregar o carro durante a noite, mas poucos prédios em Oslo têm estrutura para esse abastecimento. A maioria da população depende de eletropostos na rua que apresentam enormes e corriqueiras filas.

Há também escassez de pontos de reabastecimento fora da capital, o que leva quem parte para viagem mais distante a alugar um carregador ou planejar uma rota que possa contemplar as recargas.

Para Thiago Castilha, cofundador e diretor de marketing da E-Wolf, empresa de carregadores para carros híbridos e elétricos, as soluções estão vindo da adequação dos noruegueses. “Enquanto faz compras em um shopping, o motorista deixa o carro carregando”, aponta, mas lembra que o melhor é abastecer em casa, à noite, com carregadores particulares.

Aí reside outro problema dos noruegueses que moram em prédios antigos, muitos sequer sem garagem. Castilha ressalta que, mesmo com sua frota elétrica ainda ínfima, o Brasil dá passos adiante ao modelo da Noruega. “Já temos legislação local e o estado pioneiro foi São Paulo, com a obrigatoriedade de novos prédios ofertarem áreas adequadas para receber carregadores. Começou como uma opção a mais nos empreendimentos e hoje é tendência nos lançamentos imobiliários.”

Pelo perfil continental do País, Thiago Castilha aposta num longo período de modelos híbridos no mercado (Crédito:Divulgação)

Quanto ao problema norueguês de falta de eletropostos no interior do país, no Brasil de dimensões continentais essa questão pode mais intimidadora, mas segundo Ricardo Bastos, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico, “as vendas de eletrificados no Brasil estão todas concentradas nos grandes centros, principalmente nas regiões Sul e Sudeste. Então nós temos que preparar a partir de agora essa infraestrutura de eletrificação que vai ser aplicada nas regiões mais distantes”.

Thiago Castilha acredita que a eletrificação no Brasil, ao contrário do resto do mundo, ainda vai passar por um processo de hibridização. “Por ter esse perfil continental, faz muito sentido carros que entrem no mercado sejam híbridos. É um carro de transição para os consumidores.”

* Estagiário sob supervisão de Thales de Menezes