Comportamento

O Rio de Janeiro faz história

Palco dedecisões políticas e exuberante em charme, o Hotel Quitandinha – onde Martha Rocha foi coroada Miss Brasil – reabre suas portas. Em seu interior, no local em que antes era o cassino, agora é um centro cultural

Crédito: Divulgação

ESTILO NORMANDO Quitandinha: da fachada aos jardins diante dele, tudo é convite ao lazer (Crédito: Divulgação)

Por Fernando Lavieri

Prestes a completar 80 anos, o Hotel- Cassino Quitandinha, situado na cidade de Petrópolis, na Região Serrana do Rio de Janeiro, acaba de ganhar importante espaço que ressalta o seu vasto patrimônio histórico: o Centro Cultural Sesc Quitandinha, que será administrado pelo Sesc Rio. As mudanças feitas no interior do edifício de estilo normando conseguiram torná-lo ainda mais atrativo aos visitantes. O antigo Bar Central, por exemplo, passa a se chamar Q Bistrô, e promete disponibilizar o que há de melhor na culinária contemporânea. Quanto ao novo centro cultural, ele passa a oferecer programação artística, exposições e shows.

Uma demonstração de que passado e presente passam a caminhar juntos está na escolha dos eventos. Um deles abriu o novo ambiente: a mostra Um Oceano para Lavar as Mãos. O título foi retirado de um verso da música Meia-noite (1985), de Chico Buarque e Edu Lobo, para a peça O Corsário do Rei, do dramaturgo Augusto Boal. Em 2024, o hotel apresentará mais duas novidades: o Salão Roosevelt, construído à época em homenagem ao ex-presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt, agora se tornará cinema. E a tradicional cozinha, que já preparou refeições para personalidades como o cineasta Orson Welles, saíra dos bastidores e terá a função de mercado gastronômico.

MUDANÇA RADICAL
As dependências que acolhiam as mais diversas modalidades de jogos abrigam agora obras de arte: exposições e incentivo à criatividade (Crédito:Divulgação)

Há mais conexões entre o Hotel-Cassino Quitandinha de ontem e o centro cultural de hoje. Existe uma visita guiada diferenciada. Os turistas colocam fones de ouvido e, durante o passeio, ouve-se a voz de pessoas que trabalharam no hotel, em seu auge, e também de hospedes. Tudo como se fosse uma notícia de rádio, com ambientações sonoras e narrações. Durante o percurso aprende-se que o hotel foi fundado em 1944 pelo empresário Joaquim Rolla, momento crítico para o mundo porque a Segunda Guerra ainda se desenrolava. Aprende-se que sua arquitetura tem estilo europeu, art-déco, e a decoração, feição hollywoodiana. Mais: o edifício contava com uma praia artificial, com areia trazida de Copacabana. Escuta-se ainda que relevantes personalidades da política e das artes ali se hospedaram. O expresidente Getúlio Vargas, por exemplo, tinha um apartamento exclusivo no hotel. Muitos artistas brasileiros e internacionais foram aplaudidos por lá, entre eles, Grande Otelo, Dick Farney e Greta Garbo, Carmen Miranda e Eva Perón.

REPAGINADO Novos tempos: o salão para os tradicionais bailes de carnaval (acima, à esq.) tornou-se uma ampla
e moderna plateia de teatro (acima) (Crédito:Divulgação)
Arquivo / Agência O Globo

“O Quitandinha abrigava desde música clássica até shows circenses”, afirma Flavio Menna Barreto, autor do livro Apostas Encerradas – O Breve Império do Cassino Quitandinha. A baiana Martha Rocha conquistou nele a sua coroa de Miss Brasil, em 1954. O Quitandinha foi construído para ser o maior hotel-cassino da América Latina, mas, em 1946, o ex-presidente Eurico Gaspar Dutra aboliu os jogos de azar com o argumento de que o fim das apostas “manteria a moral, os bons costumes e a tradição religiosa no País”. Na verdade, ele cedeu à exigência de sua esposa, dona Carnela. A ação presidencial significou a derrocada do Quitandinha. Espera-se, agora, que ele volte a ser um dos principais motores culturais do Rio de Janeiro.