A Semana

Pela primeira vez o país terá segundo turno em uma eleição. Ruim para Erdogan. Bom para Erdogan

Crédito: CHRIS MCGRATH;BURAK KARA

QUEM RESPONDE? O atual presidente Erdogan (à esq.) e o oposicionista Kemal: fim do patrimonialismo de duas décadas? (Crédito: CHRIS MCGRATH;BURAK KARA)

É a primeira vez, nos últimos vinte anos, que o autocrata Recep Tayyip Erdogan não vence uma eleição presidencial no primeiro turno – aliás, nunca na história da Turquia um pleito dessa natureza foi para o segundo escrutínio. Aqueles que, em plena razão, querem ver Erdogan fora do poder estão longe, no entanto, de poderem comemorar a necessidade de outra rodada de votação, no próximo dia 28. Ela não deixa de ser um triunfo da oposição, mas ocorre que o presidente saiu-se das urnas à frente de seu opositor Kemal Kilicdaroglu, social democrata que conta com o apoio de seis partidos de oposição: Erdogan, conservador islâmico, obteve 49,5% dos votos, Kemal ficou com 44,89% — forte indicativo de que Erdogan pode esticar ainda mais as suas duas décadas de comando patrimonialista e predatório da nação. Na verdade, jamais ele esteve tão próximo de sair do governo, mas é fato, também, que a vitória final de Kemal não é favas contadas. A alta inflação na Turquia, o atual estilo de governo ditatorial e a negligência das autoridades no socorro às vítimas do terremoto que abalou o país seguirão compondo o tom da campanha oposicionista.

CULTURA
Livro inédito de Michel Foucault, quatro décadas após a sua morte

FRANÇA Michel Foucault no Museu Rodin, em 1984: o que ele diria sobre a tosca e péssima “arte” atual da fake news? (Crédito:Michele Bancilhon via AFP)
PRECURSOR Nietzsche: descontinuidade da filosofia (Crédito:Divulgação)

A maior parte do arquivo do filósofo Michel Foucault está na Biblioteca Nacional da França. Na semana passada revelou-se que, entre as obras, localizara-se uma raridade: um manuscrito inédito que por determinado tempo foi mantido em sigilo, mas que agora se torna livro e chega ao público. Trata-se de Le discours philosophique, cuja escrita foi iniciada por Foucault em 1966. No campo teórico, uma das grandes surpresas é que já nessa época o autor questionava a filosofia: segundo ele, “a verdade” perdera “sua dimensão original”. Se Foucault já pensava assim
na década de 1960 (ele faleceu em 1984), imagine-se o que pensaria nos dias de hoje quando inverdades são impostas à sociedade como princípios definitivos. A ruptura de Foucault vinha na tradição de outros grandes mestres
do conhecimento, a exemplo de Friedrich Nietzsche. Entre as principais obras do filósofo francês destacam-se História da loucura, Vigiar e punir, História da sexualidade e As palavras e as coisas.

TSE
A cassação do mandato de Deltan Dallagnol

ERRO Dallagnol: veneno com efeito bumerangue (Crédito:EVARISTO SA)

O TSE deu ao ex-procurador Deltan Dallagnol o mesmo veneno que a operação Lava Jato (da qual ele foi expoente) serviu a muitos de seus presos: uma interpretação relativamente livre do direito, ainda que sob risco de ferir garantias fundamentais, como, por exemplo, o princípio da presunção de inocência. Por unanimidade (sete a zero), o TSE cassou o mandato parlamentar de Dallagnol. Entendeu que a “manobra” em abandonar o Ministério Público Federal e candidatar-se a deputado federal pelo Paraná “impediu que os 15 procedimentos administrativos em trâmite no Conselho Nacional do Ministério Público em seu desfavor gerassem processos administrativos disciplinares”. O erro do TSE: qual bola de cristal prevê que os procedimentos administrativos iriam gerar processos disciplinares? A Corte retirou-lhe, assim, o direito constitucional da presunção de inocência, uma vez que tais procedimentos poderiam não se tornar processos. A sentença de cassação do mandato baseou-se na Lei da Ficha Limpa. Erro do TSE: procedimentos administrativos não vedam a magistrados e membros do MP o lançamento de candidaturas. A lei os proíbe caso tenham pedido “exoneração ou aposentadoria voluntárias na pendência de processos disciplinares”. Dallagnol afirmou que recorrerá junto ao STF.

Esclarecimento ISTOÉ deixa de publicar, excepcionalmente, nessa semana e nas três próximas, a coluna do jornalista Leandro Mazzini. Voltará a ser publicada normalmente na edição 2.785.